Caldo de Cultura (VIII)


Desta vez o nosso almoço foi na Universidade Lusíada e contou com a presença do Humberto Nuno de Oliveira, que não se esqueceu do livro, e com a sentida falta do João Marchante. O convidado que anunciei no post anterior não conseguiu infelizmente aparecer. O novo desafio fica assim lançado. Quem levou o quê?

Vox Populi

Esgotar a bateria do iPod pode ter consequências inesperadas. Foi o que me aconteceu hoje, num autocarro da Carris, levando-me a reparar inadvertidamente num interessante diálogo que se desenvolvia a meu lado. Não resisto a replicar aqui a troca de palavras entre um par de adolescentes lisboetas, utilizando descaradamente o título de uma fabulosa série de postais desenvolvida pelo Eurico de Barros.

Primeira jovem: «Uma pessoa tem todo o direito de não saber onde ficam os países.»
Segunda jovem: «Pois é, afinal isso serve para alguma coisa?»
Primeira jovem: «Ainda no outro dia, perguntaram-me onde fica o Paquistão. O que é que isso interessa? Por acaso até sei, fica na Ásia. Ao pé daqueles países que acabam todos em ão. Paquistão, Cazaquistão... esses todos.»

De imediato, lembrei-me as palavras sábias de Ortega y Gasset, que acusava a era moderna, a tal época do «homem-massa», de ter consagrado «a vulgaridade como direito».

Outras paragens

Devido à minha participação na conferência "O Desenvolvimento das Relações Luso-Sérvias", hoje na Universidade Lusíada de Lisboa, o almoço dos Jovens muda-se para o outro lado da capital. Mas o melhor é que vai contar com um ilustre convidado. Notícias em breve.

Do Fim e da Língua

Neste tempo que cada vez mais parece de fim de Pátria, um dos sinais que mais me incomoda e preocupa é o da banalização e consequente perda da nossa Língua. Disto tive oportunidade de falar com o Prof. Artur Anselmo após a sua excelente Lição de Jubilação, subordidada ao tema “Filologia e História do Livro”, no passado dia 28 de Março, na FCSH da UNL. Foi também a esta questão que dediquei a minha coluna na edição desta semana do semanário «O Diabo», chamada exactamente Língua, que concluí assim: “Porque se não soubermos quem foi Camões, a "Língua de Camões" deixará mais tarde ou mais cedo de ser a nossa. Perdendo o seu significado profundo e mecanizando-se passará a ser apenas um "meio" desprovido de conteúdo.

Feios, Porcos e Maus

Três problemas de emprego que não advêm da recessão impõem umas curtas linhas, para dissipar perplexidades. O primeiro reitera a noção de que os estudos na área de Psicologia servem, sobre o mais, para dar ares de pesquisa a percepções a que se chega com uma olhadela. Vêem a novidade deste? Que as Beldades obtêm mais contratações, são mais benignamente avaliadas e classificadas e triufam nos julgamentos! Alguém desconhecia a coisa, Santo Deus? E a parte que refere ser contraproducente o aspecto das Senhoras nas funções tipicamente masculinas também não espanta: no seguimento tradicional de que um homem, quanto mais feio, mais confiável, remete a constatação para consequência da mera igualdade dos sexos essa velha luta de certa Condição Feminina...


Os avanços e recuos da Oposição Líbia, mais do que levantar chatíssimas prelecções sobre a diferença de preparação e armamento das partes, reenvia para a essência da Guerra no Deserto, em que tais solavancos se mostraram adequados, desde o segundo conflito mundial. Hoje, entre reprovações de parlamentares importantes, Falcões incluídos, Obama mostrou o que venho repetindo há anos - a Política Externa dos States obedece a constantes que não dependem de eleições: em clara desconformidade com os limites das decisões internacionais; já entregou à CIA o comando dos entusiastas que, sem ele, seriam carne para canhão Khadaffiano. De imediato se demitiu o MNE de Tripoli, com o incrível nome de Moussa Koussa. O caso é revelador, já que, como antigo chefe dos serviços secretos, detém informação privilegiadíssima sobre as chances de prevalência do (ex-)patrão: e torna fantasista qualquer credibilidade de só agora ter descoberto os massacres de civis que afirmou determinarem a sua deserção. Os ratos são sempre os primeiros a abandonar o barco.


Um conceito de Emergência de cinquenta anos é coisa abstrusa, na acepção de "urgência grave". Poderíamos tentar encontrar-lhe um sentido útil, entendendo esse Estado como uma esperança de permanência na manutenção do sentido ascendente do partido que tem o Poder na Síria desde os anos 1960's. Do que sempre desconfiei foi de que ele viesse a ser levantado no preciso momento em que... emerge uma pressão inesperada. O regime veio, desmentindo tais expectativas, provar que a notícia posta a circular era para jornalista ver.

Machadada na Cultura

Recebi hoje, por correio tradicional, uma carta que, como amante da Sétima Arte, me impressionou bastante. É igualmente um sinal do estado a que o Estado chegou. Deixo aqui o link para a referida missiva on-line. Ora clicai aqui, Amigos Cinéfilos.

Post Scriptum: O «Aviso sobre o Programa de Abril», que também me foi enviado hoje, pela Cinemateca Portuguesa, traz ainda mais uma mão-cheia de más notícias.

Memorial de Abril

Que o Capitão de Abril Vasco Lourenço se insurja por o Estado a que chegámos não se prestar este ano ao costumeiro carnaval das florzinhas vermelhas e das oratórias desbragadas, é compreensível, pois quem nada mais fez na vida gosta que lhe seja dada importância, ao menos uma vez por ano. Com a crise, porém, torna-se evidente para todos o que já era certo para alguns - culpabilizar apenas os deputados pela derrocada e celebrar os sobreviventes do MFA é como pedir à família da vítima que estigmatize os gatos pingados, fazendo, em simultâneo, o elogio dos carrascos que despacharam o defunto. Por isso lastimo que alguém com menores responsabilidades históricas mas mais imputabilidades intelectuais, Manuel Villaverde Cabral, tenha alinhado na insistência de festejar, quando tantos Portugueses foram trazidos ao limiar da sobrevivência. É como aqueles que vão de gravata vermelha a funerais, para marcar posição, o que sempre condenei, mesmo quando os autores da proeza concordavam comigo. Sugiro antes, em vez dos transportes retóricos da casa de má fama e pior proveito sita em S. Bento, uma cerimónia digna, em que os cravos de sangue cedam o lugar aos fumos negros e em que por altifalantes seja difundida continuadamente a «Marcha Fúnebre» de Chopin. Não poderia juntar imagem mais descritiva do banzé em prol do folclore habitual do que a dos Cangalheiros Esfomeados, segundo o «Punch».

Lembrete à navegação

Este blogue colectivo completa amanhã, 31 de Março, dois meses de múltipla actividade diária. E parece que foi ontem que os Jovens se fizeram ao mar...

As Raízes


«Senhora da Azenha», Dazkarieh.

Regressando à música nacional, trago desta vez os Dazkarieh que, em conjunto com grupos como os Galandum Galundaina, Uxu Kalhus e os próprios Sangre Cavallum, formam uma nova geração de bandas portuguesas que fundem sonoridades tradicionais com elementos contemporâneos. Bom, de facto, não é uma tendência propriamente nova, mas tem vindo a ganhar atenção e popularidade em Portugal. Os Dazkarieh, por exemplo, já existem desde 1999. Depois de marcarem presença nos principais palcos folk do nosso país, percorreram o mundo com esta fusão musical, feita de instrumentos típicos portugueses como o adufe e o cavaquinho. Com um novo disco editado há dias, «Ruído do Silêncio», a banda encontra-se neste momento numa autêntica volta a Portugal para promover o mais recente trabalho. É de aproveitar.

Sem Água na(s) Boca(s)

Decerto que a degradação dos hábitos alimentares nos encaminha para a Doença. Mas, se essa é uma causa imediata, a raiz profunda encontra-se na busca do conforto que lhe está subjacente. Ao eliminar o exercício natural, remetendo o esforço de que o organismo precisa para horas compensatórias num dos extremos do dia, o nosso mundo está a pedi-las. Ainda pior quando a gula se orienta não já para a ingestão de quantidades, mas para a equação que assenta na facilidade e rapidez da preparação, como na menor subtileza da degustação. Nesse sentido, é muito importante atentar na comparação que o Médico Kevin Patterson nos revela, da alteração dos tipos morfológicos que se expande do Ocidente para outras sociedades. Desde que não se caia na armadilha da culpabilização da nossa área por mais essa exportação de um malefício prejudicial ao resto do Mundo, já que fomos os mais prejudicados e há mais tempo. Dessa forma, fico de boca aberta (ai!) com a oportunidade perdida pelo Presidente Chávez: tendo pregado à Frei Tomás o emagrecimento dos Venezuelanos, não se lembrou de culpar o Capitalismo pelo alastramento da calamidade de obesidades e diabetes, domínio em que as multinacionais e o Mercado, efectivamente, têm culpas no cartório; mas, bem pelo contrário, ocorreu-lhe responsabilizar este sistema económico pela ausência de vida em Marte. Qual será o termo equivalente a lunático, no caso em apreço? Marciático? E não devemos sublinhar, como truísmo e tautologia irrefutáveis, que o apertão de cinto pelo Dr. Teixeira dos Santos a nós imposto estava afinal era a tratar-nos da saúde?

Sem papas na língua

A cidade hoje já não é o que foi no meu tempo, o que é natural. Mas o pior é que mudou com tal ímpeto que tudo o que era pitoresco vai de gangão desatinado para o esquecimento com passagem pelo camartelo demolidor, e assim já de todo acabaram os carvoeiros onde se bebia o melhor vinho, por tijelas brancas vidradas, e havia quase sempre, para fazer boca, pasteis de bacalhau e uma velha a assar castanhas. Acabaram os carvoeiros substituídos por estabelecimentos de venda de carvão a retalho, revestidos de azulejo e tão penteadinhos que até a gente tem vergonha de lá entrar. Esta gente moderna, com suas higienes e posturices, substituíram as iscas e o pastel de bacalhau por bolos de arroz e brioches e o vinho por leite, não se tendo convencido nunca de que não há raça forte com semelhante alimento e a resultante foi a substituição das touradas pelo futebol e dos homens pelos maricas.

ALBINO FORJAZ DE SAMPAIO
(1884 — 1849)

Parar e pensar a cidade

O Príncipe Carlos de Inglaterra está em Lisboa. Bom seria que O consultassem para efeitos de Arquitectura e Urbanismo. No entanto, cheira-me que os nossos edis não estão para aí virados. A propósito, destaco um oportuno e certeiro texto de António Rosa de Carvalho, o qual sugiro ser complementado com a leitura dos artigos de Francisco Cabral de Moncada sobre Arquitectura Tradicional.

Acto Fal(h)ado


Há pelo menos um campo em que o Político em questão deu o exemplo: o esforço pessoal em ordem ao desiderato que o seu tropeçante discurso inicial promoveu foi muito mais hercúleo do que o que poderia pretender do público. Mas, mais do que o lapso de palrador, ao contrário de Guterres com a conta do PIB e Valentim, emendando o Viva ao dito Engenheiro para um outro, a Gondomar, a indigência da correcção do engano socrático é significativa - no íntimo esta triste caricatura de governante amalgama a solidariedade ao pauperismo. Está tudo explicado.

Os animais ferozes de amanhã


Nunca tive as juventudes partidárias em grande conta, mas sempre acreditei que pudessem ter um papel importante na formação de quadros e na preparação de jovens para o combate político. No entanto, quanto mais jotinhas conheço, mais desiludido fico. Afinal, as juventudes partidárias não são mais do que escolas de maus costumes, academias especializadas em introduzir adolescentes medíocres aos vícios dessa baixa política que caracteriza a arena partidária. Jovens sem valores e sem ideias, que nunca leram um livro e que mal sabem exprimir-se em português. Boys e girls, miúdos pobres de espírito ensinados a acenar em vez de questionar, cuja única mais-valia é a capacidade de sobreviver, de manter a cabeça à tona ao longo de jogos de interesses e lutas de influência. É a essa gente que é suposto entregarmos o Futuro de Portugal?

É possível fazer-se uma revolução espiritual?

Mircea Eliade, partindo da análise do caso português, desenvolve uma tese onde conclui que sim. Graças a Deus, ao fim de quase 70 anos, a fundamental obra foi vertida para Língua Portuguesa.

Em Vias de Extinção?


Para verem como me preocupo com o (bom) Ambiente, alertado por um Ecologista do calibre do meu Amigo Paulo Almeida, convido-Vos a proteger esta ameaçada espécie, na era da invasora electrónica.

A Escalada do Nu

Confesso que hesitei, ao tentar encontrar a interpretação correcta para a indignação dos circunstantes em face da prioridade dada pela equipa de salvamento da alpinista desnudada da Califórnia à cobertura do seu corpo por vestes, em detrimento da recolha imediata da aflita aventureira. Com efeito, apesar do cuidado de terem dado a missão a um elemento do género feminino, nestes tempos tal não dá garantias de, estando a socorrida em pelo, os autores do seu abraçante resgate não virem a ser acusados de comportamento impróprio e atentado ao pudor, na mais benigna das hipóteses académicas dum litígio. Como também tive em mente o acquis artístico indutor de reprovação em circunstâncias conexas, o de Millais ter apelidado o herói que apressadamente liberta a menina em apuros, tal como ela veio ao Mundo, de Knight Errant, o que tanto dá para Cavaleiro Andante, como para Cavaleiro Que Faz a Asneira...


Há, de facto um sentido mais sério e preocupante - o de, naquela praia de nudismo, os banhistas e outros frequentadores pressionarem todo e qualquer turista passageiro a manter a forma de naturismo radical que preferem. O que nos leva ao estado das sociedades ocidentais de hoje, pejadas de enclaves de cumplicidades localizadas que procuram a todo o custo fazer soar bem alto a demarcação do Todo com que, em conjunturas mais saudáveis, deveriam privilegiar laços. É a entropia sócio-cultural.

Do desvario em que anda o mundo

Foram avistados hoje dois tubarões no Guincho.*

*Não, não é uma metáfora sobre o mundo (pós-)moderno. Parece mentira, mas é verdade. Aconteceu hoje com um grupo de surfistas, felizmente sem consequências, onde estava a Filha de Amigos meus.

Vitória em Estalinegrado


O melhor postal que li sobre a queda do governo está aqui e tem a assinatura desse solitário franco-atirador que é O Jansenista: «Não vejo motivo nenhum de celebração na queda do Governo, por mais justificada que ela seja. O eleitor mediano é tão estúpido e atordoado que vai votar em mais do mesmo». Headshot.

Rei-Sol x Estado-deus


Não consigo deixar de sorrir quando oiço gente muito moderna e, como é lógico, muito liberal, muito democrata, falar desdenhosamente do "absolutismo" dos Reis. É sempre de bom alvitre recordar que absoluto mesmo, e o que é pior, tirânico, é esta maravilha do Estado democrático, moderníssimo, baseado na vontade ilimitada de uma maioria aritmética, real ou fictícia. Os Reis autênticos eram, estes sim, limitados pela tradição, pelos costumes, pela Ordem Natural, pela Lei Divina. Para não nos alargarmos muito fiquemos com Luís XIV, a quinta-essência do monarca absoluto. Pois bem, é o Rei-Sol que estabelece que não se cumpra nenhum decreto Seu que seja contrário às leis dos Reino e às Leis de Deus. Por exemplo, não passaria pela cabeça real alterar o direito de família, fortemente marcado pela moral e pelos costumes. Já o "nosso" querido Estado da soberania popular, do sufrágio universal e - sobretudo - da partidocracia, tem as mãos e as patas inteiramente livres para revogar até mesmo as leis da natureza, como tem-se visto, e de sobejo. É, pois, para honrar o Rei-Sol e sublinhar o devido desprezo ao Estado-deus, que trago-vos, para a hora do chá, um bocadinho de Lully.

Sugestão para Sábado à noite


The Field (1990). Ambientado na Irlanda dos anos 30 - ainda celta, católica e rural -, este grande filme trata do apego à terra por aqueles que a cultivam, na continuidade das gerações que nela não só encontram o seu sustento material mas também o seu suporte identitário. Tal concepção tradicional da terra como património físico e moral - na indiscutível chave barrèsiana da terra e dos mortos - choca frontalmente com a modernidade materialista e especuladora. Este embate mortal é aqui examinado através das fantásticas actuações de Richard Harris e John Hurt. Gostei tanto desta obra que em 1995, durante um périplo pela Ilha Esmeralda, fiz questão de dar um salto ao local da filmagem - e não faltou o pint de Guiness no pub que tantas vezes serve de cenário.

Euroquinhões

No day after daquele em que muitos compatriotas acreditaram passar a cura dos seus males por um revisionismo da célebre injunção de diagnóstico clínico que se traduzisse num diga 133!, deitei-me a reflectir sobre a propensão ao jogo que faz de nós os maiores apostadores do Euromilhões.
E lembrei-me da letra duma conhecida canção francesa, a qual aponta ao passante uma depressão tranquila. Depressão tranquila e colectiva, que melhor descrição poderíamos pretender do nosso estado? Terreno fértil para a alimentação artificial de expectativas que adiem a revolta e o desespero conducentes à acção, substituindo-os pela espera paralisante que delega no golpe de sorte a resolução dos problemas.


Por isso somos os que mais jogam e os menos violentos. A receita alienante estende-se ao nível supra-nacional e, em países de similar modelo, tenta-se agora uma novidade no mais velho excitante individual e calmante colectivo que é o sorteio de números. Sem a componente da excentricidade estimada que está presente nas apostas inglesas sobre tudo, transfere-se para a abstracção da escolha dos algarismos as reservas de atenção expectante do vulgo. Cria-se uma nova extracção, garantindo todos os dias o circo completo, aquele que acumula uma hipotética promessa de mais e melhor pão. E usa-se o vetusto truque para viciar, perdão, fidelizar os jogadores - aumenta-se a possibilidade de prémios-migalha estimuladores do sonho, avolumando a dificuldade de acertar nos valores maiores.
A "felicidade instantânea" assim prometida ameaça bem ser a espelhada em A Lotaria, de Van Gogh. Pelo que, coerente como sempre, lá irei deitar os meus dois euritos no concurso da próxima semana.

Rica Visão!

Recuso enfileirar no criticismo a uma só aparente confusão da «Forbes», por meio do seu blogue. Salta à vista, com efeito, que o ressabiamento do Prof. Carrilho o torna muito mais plausível como líder oposicionista ao socratismo, do que a cumplicidade do Líder do PSD, só finda à custa de muita pressão interna, depois de a conjunção do descontentamento popular e da má-criação governamental ter feito muito notável laranja farejar o sangue.
Claro que não podiam pressupor os observadores estrangeiros que uma remoção socrática, agora - como defende o antigo Ministro da Cultura -, tendesse a redundar num favor ao actual chefe Socialista, o qual, poupado a prova(ção) eleitoral imediata, poderia retornar, mais tarde, com a auréola de injustiçado, sempre mais durável na memória curta dos eleitores do que a autoria da inflicção das dificuldades que, decerto,vão permanecer.
Assim, parece evidente estar um periódico vocacionado para as questões da riqueza mundial predisposto a desconfiar de que a nossa salvação, retirando um Coelho da cartola, se reduziria sempre a passes de ilusionismo para fora, como a Passos de ilusão para consumo interno.
Não, onde a análise terá falhado redondamente é na ingénua crença de que, deixados a ver estrelas pela desgovernação cessante, ainda ostentamos cartolas donde se possa retirar alguma vida...

Caldo de Cultura (VII)


Mais um almoço das quintas, mas desta vez sem Cozido. Faltou também o João Marchante. Em compensação, contámos mais uma vez com a presença do nosso estimado Bruno Oliveira Santos. O desafio continua de pé, e o prémio mantém-se. Quem levou o quê? Aceitam-se apostas.

Introdução à Cátedra

Devo deixar bem claro que o aborrecimento em mim produzido na passagem pela Universidade jamais me levou a um sentimento rebarbativo contra o Ensino Superior.
Tenho porém de rever a minha postura, pois é nesse plano, não no moral, que julgo dever ser analisada a história pisada e repisada do convite por um professor de Sexualidade do Illinois a um parzinho, no sentido de, numa aula suplementar e facultativa, mostrar a uma turma de alunos seus como chegar ao prazer com a introdução de um... objecto estranho.
Isto, à uma, porque tenho de aconselhar nesta matéria aos alunos o autodidactismo, caso contrário podem ficar pouco preparados para a vida prática, com a circunscrição a um peep show do ensino magistral antes tão condenado. Depois, por verificar que não estão a estimulá-los a praticar no instrumento para que nasceram, E, por último, pela meridiana razão de, nos tempos que correm, um diploma estar muito longe de lhes garantir bom emprego...

A Queda de um Anjinho

Quase chorei com a auto-edificação angelical do Demissionário da véspera, dizendo ter sido o único a procurar exaustivamente o consenso e haver esbarrado na tal coligação negativa dos outros todos. Claro que a negatividade, quando se reporta a uma permanência negativíssima, passa a positiva; e há muito que este anjo é um dos que confundiram Lucífer com a Luz, facto comprovado por se ter mostrado peco em negociar aquando da apresentação unilateralista em extremo de mais este PEC. Mas pouco importa, o que interessa é sublinhar que, com o tempo, o PM em gestão perdeu qualidades de detecção de perigo sobre si impendente: não percebeu, por exemplo, que estas declarações de Bruxelas traduziam, para quem soubesse ler, o puxar do tapete onde assentava os pés.
Como não foi capaz de antever que a subserviência, aqui sim, de Passos por perder do partido laranja estava, finalmente, madura o bastante para para mudar...

As imagens são Anjo Cadente de Elaine Conneely e a revisitação de His Master´s Voice que se impõe, por Banksy

Maurice Barrès

Barrès é, para mim, não só o grande teórico mas o pai do nacionalismo, tal qual o entendo. Concepção marcadamente emotiva, orgânica, assentada sobre o duplo fundamento da Terra e dos Mortos, é a Nação o valor supremo na ordem temporal. Se podemos ler Barrès nas trilogias do Le Culte du Moi ou do Roman de l´Énergie Nationale, em Scènes et Doctrines du Nationalisme ou em La Colline Inspirée, podemos o ouvir aqui:

Estrela CaNdente

Elizabeth Taylor ganhou com a idade uma energia interpretativa que Lhe assegurou o prolongamento da via do êxito antes assente também na vulnerabilidade que tornava inesquecíveis as suas interpretações adultas da juventude. «Quem Tem Medo de Virginia Woolf?» face a «Bruscamente no Verão Passado», se me percebem...
Mas igualmente pela ausência de esforço, o Dom e os dons naturais. Aos rememoradores da «Gata...» gostaria de adicionar, hoje, o deslumbramento desta imortalização retirada de «Um Lugar ao Sol». Que, estou certo, Ela terá finalmente encontrado.

R.I.P.

In Hoc Signo?

Até ver, continuo a acreditar que o Presidente Medvedev é uma mera criatura de Putin e que ainda vai sendo o actual Pemier a puxar os cordelinhos da Rússia. Não enfileiro é, tão rapidamente como outros, pela ideia de que a recente assimilação do intervencionismo na Líbia pelo Chefe do Governo e a "desautorização" subsequente pelo Supremo Magistrado configurem uma combinação que os fizesse reencarnar um Jekyll & Hyde reversíveis, conforme fossem vistos da perspectiva Norte-americana e Europeia Ocidental, ou, ao invés, do miradouro afro-asiático-latinoamericano.


Não, o que creio que aconteceu foi a manifestação da diferente envergadura histórica de cada um dos protagonistas e que terá tido como prioridade o consumo interno: o assumir pessoal de um sentimento nacional de demarcação, num Estado Imenso que gosta de se ver como herdeiro dos Bizantinos pelo traço de união que é a Igreja Ortodoxa, como a tentativa de provar alguma emancipação da tutela, sentindo as costas quentes dos poderes internacionais por ora ainda dominantes. A qual teria em mente um recalcamento enraizado a Leste, o de como essa maravilha de mobilização, ao princípio desinteressada, que deu nas Cruzadas, havendo começado por se apoiar em sinergias de resistência ao Cisma Oriental, acabou por afastar as duas metades da Cristandade uma da outra, culminando na entrada dos expedicionários em Constantinopla, por 1202.
O que é grave não é que na metade continental a Oriente estas Guerras Santas tenham má reputação e sirvam de papões, coladas a sucessos militares que lhes são absolutamente estranhos. O trágico está em o nosso lado se envergonhar delas e se desculpar de os seus ancestrais as terem encetado. Essa é uma cruz que carregamos, bem diversa Da que os Guerreiros de Outrora fervorosamente envergavam.
A imagem é a Entrada dos Cruzados em Constantinopla, de Delacroix.

Tão actual que até faz impressão!

Os Sete Pecados Mortais da Democracia:
A Soberba Individualista;
A Avareza Capitalista;
A Luxúria das Palavras;
A Ira Revolucionária;
A Inveja Democrática;
A Gula do Orçamento;
A Preguiça Constitucional.


António Pedro, in jornal Revolução (série de 7 artigos, 1932).

A queda do governo já começou...

Quadros (II)

Como aqui referi, um dos meus objectivos na recente passagem por Florença era ver o retrato de D. Sebastião que está na Galleria degli Uffizi. Consegui vê-lo, apesar de estar no alto da galeria, ao lado do retrato do seu tio, o Cardeal D. Henrique. Infelizmente, não me foi possível apreciar a miniatura sobre cartão que também o retrata, porque a sala onde está exposta encontrava-se com o acesso vedado. Era uma óptima ideia que o MNAA organizasse uma exposição com todos os retratos do Desejado que se encontram espalhados por vários países.

Por amor dos Deuses

Sobre os impactes do infeliz «acordo ortográfico», vale a pena ler o excelente texto do egiptólogo José das Candeias Sales no jornal i — um dos poucos, a par do Público, d'O Diabo e d'A Bola, que ainda não adoptou a nova grafia. A verdade é que em vez da aparente evolução, este (des)acordo representa uma autêntica mutilação, não só da língua, mas também do património histórico e cultural:

«O desaparecimento ortográfico do "p" em Egipto é simultaneamente o desaparecimento da sua memória nessa palavra em português. E nada pode ser mais grave para uma entidade do antigo Egipto que a perda do seu nome ou da sua memória. Se a consoante que cai é muda, a sua queda é bastante eloquente. No âmbito do acordo é apenas um pormenor. No âmbito da milenar história e cultura egípcias é uma alteração nuclear. Simplifica-se a grafia, o que é entendido como uma "evolução" cultural, mas para "Egito" e Ptah essa evolução tem elevados custos culturais. Não deixa de ser irónico que para o mais intelectual e "linguista" dos antigos e eternos deuses egípcios o sacrilégio venha do futuro e da linguística.»

Mais do mesmo?

Neste restinho de Portugal que teima sobreviver, vejo muita gente ansiosa pela iminente queda do (des)governo, e oiço outro tanto a falar em democracia e instituições. Eu penso e digo apenas isso: não adianta mudar as moscas... É preciso atirar com este regime para o esgoto de onde saiu. E com ele todas as suas moscas.

"De origem"


Os caprichos semânticos dos abrilinos são uma delícia. Depois da "ditadura", do "fascismo" e da guerra "colonial", repetidos à exaustão, andam agora a martelar com o... "de origem portuguesa". Quer dizer: os brancos naturais do Ultramar - os euro-ultramarinos -, já não são mais portugueses tout court, mas apenas "de origem portuguesa", o que, claro está, não é a mesma coisa. E pensar que metade das pessoas que conheço viveram toda uma vida neste engano! Aproveitando o ensejo, e já que o nosso PCP não anda lá muito pródigo com as suas "piquenas", lembro aqui uma dessas "de origem portuguesa", a "moçambicana" Tasha de Vasconcelos.

Porque hoje é segunda-feira

Pedro Guedes da Silva, autor do Último Reduto e director da Alameda Digital, assina a sua coluna semanal «Expresso do Ocidente» no Eternas Saudades do Futuro.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

Estávamos na primeira metade da década de 90, essa Idade de Ouro portuguesa vivida à base de obras públicas e fundos comunitários. Eu era um miúdo a passear com os meus pais pelo centro de Almada. A certo ponto o meu pai parou, surpreendido, ao encontrar uma casa de penhores. Eu nunca tinha ouvido falar de tal coisa, mas ele lá me explicou, espantado por há muito tempo não encontrar estabelecimentos desse tipo. Os tempos mudaram e hoje é raro passear na rua e não encontrar uma casa de penhores ou um desses sucedâneos pós-modernos que são as lojas que «comercializam e reciclam ouro, jóias e metais preciosos». Mais uma face dessa crise que muitos já não estranham, e que teima em entranhar-se no nosso país.

Sugestão para Sábado à noite


Porque hoje é sexta, e na esperança de que o nosso professor e o nosso crítico não julguem que estou a meter a foice em seara alheia - e também inspirado por um postal do Miguel, deixo aqui uma das atribulações do Antoine Doinel, personagem à volta da qual o grande Truffaut realizou cinco filmes.

Caldo de Cultura (VI)


Mais um desafio, quem levou que livro? Mas desta vez com prémio. Quem será o nosso próximo conviva?

Prôfêçô Dôtô


Acabo de saber que o Sr. Luís Inácio Siuva, ex-presidente do Brasiu, será agraciado com um doutoramento honorário pela - nada menos! - Universidade de Coimbra. Os graus "académicos" deste tipo valem o que valem, e quando o exercício confina-se a uma dimensão verdadeiramente surrealista, então valem o que valem o ego de quem o recebe e a demagogia ou subserviência de quem o confere. Nada mal para o Sr. Siuva quem, entre frases do tipo nos meu governo teve menas infração (subida do nível de preços) ou quando o Napoleão foi na China, gaba-se de jamais ter lido um livro e trombeteia a inutilidade do estudo, sobretudo o universitário. A velhíssima instituição fundada por D. Dinis, alma mater de um Oliveira Salazar, um Cabral de Moncada, um António José de Brito, um Veríssimo Serrão, está mesmo de parabéns. E eu que julgava que neste crepúsculo nacional nada me poderia surpreender...

Drieu

Há 66 anos Pierre Drieu La Rochelle dizia adeus ao mundo dos vivos. Para recordá-lo releia-se, pelas mãos do amigo Nonas, o belo texto de Goulart Nogueira, publicado em Março de 1960 (Tempo Presente).

Angola - 15 de março de 1961

Há cinquenta anos, em Angola, milhares de portugueses foram massacrados, esquartejados à catanada, mulheres violadas e esventradas, bebés esmagados contra as paredes, homens castrados e decapitados, etc. Tudo em nome da liberdade e da democracia, da independência dos povos, do ideário de 1789, do socialismo, do anti-fascismo e outros mimos. Descontando o assalto à esquadra e à cadeia em Luanda, ocorrido a 4 de fevereiro, pela magnitude da selvajeria, os acontecimentos do "15 de março" marcam o início daquilo que seria conhecido como a Guerra do Ultramar: a defesa da integridade das gentes e das terras do Portugal d´além-mar. Meus pensamentos e minhas orações vão para as vítimas desta barbaridade e das que se seguiram, culminando com a demoníaca "descolonização exemplar", e para todos aqueles que tombaram na defesa intransigente da Pátria. Confiante de que todos estes dormem o sono dos justos na Divina Presença, espero que as bestas "humanas" responsáveis por tais monstruosidades - muitos deles e seus companheiros ainda andam e pontificam para aí! - recebam, uma vez chamados pelo Senhor da Vida, aquilo que lhes corresponde.

Um autêntico Sacerdote de Cristo


Hoje não posso deixar recordar o trigésimo aniversário da morte de um expoente católico e grande argentino, o Padre Leonardo Castellani, exímio tomista e Doctor Sacro Universal. Teólogo, filósofo, poeta, escritor de fina pluma, foi também um pensador político de referência, crítico implacável do liberalismo - o qual identificava como etapa do processo de destruição da Cristandade, iniciado com a Reforma protestante, continuado com o Ilustração e a Revolução francesa, e que vai desaguar, como consequência lógica, no comunismo.

Quando Lisboa Tinha Sorte...

Em Dia do Consumidor cumpre salientar o tempo que nos dava uma caixa de papel para cada gosto, em lugar de uma embalagem plástica padronizada. Mas, voltando à simbologia por detrás da superstição, o Trevo que denominava a loja é significativo a vários níveis. Entra pelos olhos dentro que a planta que Eva teria colhido do Jardim do Eden ao ser expulsa, para prolongar um pouco no mundo inferior a atmosfera das delícias, tem cada vez menos lugar, à medida que os nacos paradisíacos retrocedem na Capital.


Há porém mais. Queria o Folclore que a rapariga por casar que comesse um trevo de quatro folhas achado o faria com o primeiro homem livre que encontrasse. E que o sujeito solteiro que deparasse com tão rara planta e a colocasse pela manhã dentro do sapato encontraria noiva na moça que lhe surgisse pela frente. Não é preciso ser grande intérprete para perceber que se estava diante de um hino contra a fast food e pela naturalidade no fabrico do calçado, em épocas onde o Matrimónio era uma sorte e não se arriscava às contrafacções em curso.
Simplesmente, pode-se verificar como toda a Beleza está prestes a ser derrotada por outras vulgarizações igualmente multiplicadoras e deprimentes, como a da produção em massa - a plantinha que tão rara era vê hoje serem vendidas e empacotadas sementes dessa modalidade tetrafolhada. É o fim!

O mito do Portugal livre de energia nuclear


Não consigo evitar um sorriso sempre que encontro activistas conta a energia nuclear. Dizem eles que «Portugal Nuclear, Nem Pensar!». Talvez quando olharem para este mapa durmam um pouco menos descansados. É sabido que Espanha tem várias centrais nucleares em funcionamento. O que pouca gente sabe é que uma delas está aqui bem perto de nós. É a central de Almaraz, na província de Cáceres, cuja refrigeração está a cargo do rio... Tejo. Pois é, e está a 160 km de estrada da fronteira portuguesa, o que dá cerca de 100 km em linha recta. Com dois reactores, esta central gera 9% de toda a energia produzida em Espanha. Enquanto muitos se entretêm com debates sobre um Portugal livre de energia nuclear, é bom que se lembrem que o nosso país está na mira de todos os riscos, sem tirar qualquer benefício.

A ferro e fogo

Depois do festival de blasfémias do Prizidêntchi Siuva lá do Patropi, quem, a menudo, gabava-se da sua semelhança com Nosso Senhor Jesus Cristo, como "homem sem pecado", agora a moda parece estar a ser seguida na vizinha Argentina. Em plena construção do mito de São Néstor Kirchner, o Ministro da Agricultura compara um vinho, produzido sob a chancela estadual para fins de propaganda justicialista, com o sangue Divino e declara, em alto e bom som, que tal como Cristo dera a Sua vida pela humanidade, o antigo presidente dera a sua pela política. É pena que no país dos gaúchos aqueles que enchem a boca com o nome de San Martín não se lembrem do correctivo que o general reservava aos blasfémos: furar-lhes a língua com um ferro em brasa.

Queijo Suíço

Esta tacada no Orçamento já dava para desconfiar...mas a legislação fiscal, o nosso mais notório handicap , confirma-o inteiramente:
o actual (des)Governo só dá buraco!
A imagem é Para o Buraco de Jakub J. Ziolkowski

Vai Um Mergulho?

Não nas águas, que a temperatura ainda o não permite. Mas numa "piscina" como a da fotografia intitulada «O Leitor», da colecção Hulton-Deutsch e que um Querido Amigo me trouxe de Paris...
Ser amicalmente associado a um labor destes é não pequeno piropo para um acumulador que tenta ler qualquer coisita do que junta. Sempre com a prevenção do grande Mâncio presente: Se és daqueles que confiam totalmente no que os livros dizem, melhor será que não tenhas um único.


Mais, eternamente preguiçoso e anárquico nas incursões pelas páginas, pensando como pôde um Louis Barthou achar que o amor comum dos livros criava a melhor das solidariedades, a da ordem, da clareza, do trabalho, do estudo. Não deve ter lido os mesmos volumes que devorei, ou, ao menos, com a mesma intenção. Sossega-me muito mais Cocteau, com a neutralizante arte do paradoxo libertador - A maior obra-prima literária não passa de um alfabeto em desordem.
Combinando com a imagem de baixo, grudada que costuma estar à porta do meu frigorífico, tento retirar outra conclusão. A de que são precisos muitos anos de treino para nos não deixarmos extenuar em tão boa companhia.
Mas lá continuará, forçando-me a tomar o alimento numa acepção também espiritual, de cada vez que o estômago tentar impor a sua tirania.


A Lição do Passado

Corre uma certa discussão na Pátria do Tio Sam sobre o bem-fundado da decisão directiva de certa escola, de retirar do contacto directo com os alunos uma professora que na juventude tinha protagonizado cinema pornográfico. O caso é bicudo, sem trocadilhos. Não compro as cautelas quanto à idoneidade moral, crendo no arrependimento: a visada passou anos a fio a dar aulas, sem suscitar queixas, constituiu família estável, parece fugir mais do passado do que aqueles que o censuram. E a mesma sociedade que põe criminosos condenados por pedofilia a reinserir-se no lugar de vigilantes em estabelecimentos de ensino parece não ter grande fundamento para recusar a docência a quem nem sequer cometeu um delito. Um cínico poderia mesmo dizer que leccionando a Senhora a cadeira de Ciências, teria um curriculum invejável na parte do programa dedicada à anatomia,Por outro lado, há o problema da autoridade sobre a turma. Apesar de não ter caído em qualquer comportamento inadequado, ao contrário da portuguesa que se deliciava em trazer conversa erótica para as aulas, esta residente do Missouri - e não Minnesota como a notícia borrou - pode estar sujeita à risota geral de cada vez que um fedelho menos respeitador traga o assunto à baila. Além de que não papo a conversa da excelente relação que ela mantém com a miudagem, afinal foram alguns deles que a vieram por este meio embaraçar.
É árduo tomar posição (outra vez, sem segundos sentidos). Posso é opinar que penso merecer investigação e eventual reprimenda o comportamento dos delatores. Não só porque não devemos formar ou encorajar bufos, mas porque esta preocupação moral se terá aproveitado do visionamento de filmes com demasiados Xs.
A imagem, de um modelo sem desvio equiparável, é Professora de Marlene Dumas.

Graus no Desespero?

Oliveira Martins escreveu sobre Antero que a vida nem vale o trabalho de nos desfazermos dela. Mas uma constatação tão desiludida e cómoda não expressa o maior dos horrores, o do vazio, sempre existencialisticamente ávido de reacção dorida à miséria de um Outro que até de si se pode tirar. Quando não se consegue ser picado por esse pretendido aguilhão, ou, atingindo-o, se quer retroceder, o inconformismo face à própria insuficiência, expresso de forma residual mas omnipresente na incapacidade de prescindir do conhecimento frustrante, pode dar-nos lamento tão opressivo como a poesia do Filho desse Reporter X de que o João Marchante nos falava inda há dias. Muito mais esmagador do que a trombeteada tristeza dum António Nobre, sempre publicitário do seu sentimento em busca do efeito, ou da deixa testamentária dele, como O Desesperado de Courbet, abaixo, sempre me pareceu ser.


De Reinaldo Ferreira,

Desalento

A Deus pedi a dor que merecesse
O grande desvario a que desci
Mais perto do meu sonho me senti;
Não sei de pior mal que Deus me desse.

Contrito me mostrei que desfizesse
A teia das esperanças que teci...
Mas surdo se mostrou, em vão pedi,
Nem há talvez um Deus que tal pudesse.

Ao que Deus se calou, que direi eu
Se a esperança de esquecer-me se perdeu
E não suporto a dor de recordar-me?

Direi que sofro um mal que não se cura
E vivo deserdado da ventura
Que só a noiva-morte pode dar-me.

Rua!

Este rapaz compreensivo pensa que pode surfar sobre as multidões, dizendo que as entende. Sim, a mesma percepção que tem o assassino do estertor da vítima, o agressor dos gritos do ofendido e o ladrão dos lamentos do lesado, passe a comparação. Para quem esteja imerso na neutralidade de não apreciar a política de massas, nem a governação incompetente e arrogante, apoiar uma das partes em liça terá de assentar na observação de qual tomou a iniciativa de fazer mal à outra. No Portugal de hoje não restam dúvidas. Daí que seja um alívio ver um regime que nasceu na rua sofrer, ligeiramente, muito embora, na pele dos seus piores elementos, pelos ferros com que antes matou.


Tão nefasto é o balanço que até o próprio perpetrador é capaz de fazer, que não encontrou melhores medidas no curriculum do que a matança abortiva, a dupla desvalorização do Casamento - pela banalização dele e pela erradicação da responsabilidade na sua manutenção -, além de uma tímida estatuição de quotas políticas femininas, onde eu gostaria de ver nove décimos, em vez de paridade.
Mas ninguém é enganado, o que o declarante queria era dar graxa aos líderes visíveis da convocatória bem sucedida de ontem, sabendo que eram originários da Esquerda a quem estas bandeiras costumam agradar.

O Sol Continuará a Nascer!

Terramoto, maremoto (tsunami), incêndio(s). Que reedição do malfadado 1 de Novembro de 1755 na nossa terra! A catástrofe por definição que mobilizou as melhores penas do nosso Mundo no afã de tentarem encontrar um sentido para a perda mais emblemática. No momento em que um desastre decalcado assola o Japão, imagino a paralisia que impende sobre quem hoje tente escrevê-lo, aprisionado na voragem das notícias que não permite exprimir a Compaixão, salvo pelo horror instantâneo que nobilita... sem ilustrar.
Se a Ironia tivesse cabimento, haveria que pedir-lhe contas de o único Povo que sofreu as consequências da explosão nuclear belicamente infligida por mãos alheias se encontrar ameaçado de flagelo de natureza aproximada devido ao próprio e pacífico esforço. Mas a altura não é para inteligência, senão para Sentimento. E para nos assombrarmos com a constatação de que um tão belo mito da criação como a origem insular Nipónica devida ao agitar das águas pela lança dos Deuses Izanagi e Izanami se encontre tão horripilantemente estigmatizado pela odiosa retribuição da revolta dos elementos, que deve, Lá como cá, contribuir para nos tornar a todos mais humildes.
Vale que nenhuma Gente honra os seus Mortos como Esta.


Inclinando-me, trago a imagem do mito fundador por E. Kobayashi e fecho a caixa de comentários correspondente, por a tagarelice que ajuda à felicidade em circunstâncias mais amenas ser aqui totalmente descabida.
Sem ter falado com Eles, julgo que as condolências que desajeitadamente esboço são partilhadas por todos os Camaradas do blogue.

Mudar de Nome


Palavra de ordem do dia para toda uma Geração:
DESENRASQUEM-SE!

Todo um Programa


Apesar da magra vitória de ontem, ou talvez mesmo por causa disso, continuo em modo francófilo. Assim, aproveito para destacar um artigo da edição de ontem do i, que opõe dois grandes mestres da nouvelle vague — Jean-Luc Gordard e François Truffaut — a propósito de um documentário recém-estreado. Diz o texto que o realizador de «Les Quatre Cents Coups» e «Fahrenheit 451» tinha como programa «ver três filmes por dia e ler três livros por semana». A mim parece-me uma receita extraordinária.

Partindo a Loiça

Mais leal do que outras figuras estabelecidas da nossa política, as quais dirigiram à Juventude em efervescência cantos de sereia que julgavam tentadores, no sentido de os seus mais activos membros integrarem as suas instâncias decisórias, ou seja, as do inimigo identificado, o Dr. Marques Mendes tentou televisivamente defender o indefensável, quer dizer, a partidocracia.
E disse que não se podia dizer que tudo era bom no restante Portugal e que maus seriam os partidos, porque estes eram emanações da Sociedade, no seu todo.
É precisamente este ponto que eu contesto. Uma organização de cariz partidário, em monopólio ou em competição, não participa apenas da maldade difusa de alguns dos seus membros. Bem ao invés, incita muitos indivíduos ao mau caminho, na medida em que oferece cobertura para as más acções que empreendam e fornece atalhos para poleiros decisórios independentes de um chamamento superior não-faccioso. Além de que fracciona por definição o Todo, transferindo os instintos de solidariedade da Comunidade Nacional para amputações rivais umas das outras, salvo no que toque a quotas pré-acordadas de distribuição de cargos, ou da união esporádica contra a ameaça comum quando, como parece ser o caso, os seus expoentes se sentem acossados.
Melhor do que eu o jornal «A Monarquia» de 8 de Junho de 1921 fala da horrenda perversão, num texto em muitos passos actual. Clicai na reprodução em dose dobrada e, superiormente, fazei o Vosso juízo.
Há é que combater nos Revoltados a ideia de que a culpa não é do sistema, já que anseiam por encontrar uma responsabilidade concreta no conjunto desta classe política. Com a actual estrutura governativa estão condenados ao desânimo, pois qualquer epígona dela, mesmo a que os Puros Indignados de hoje viessem a gerar, fatalmente cairia na mesma viciação que dá vómitos. Há que reconhecer as organizações criminosas, para além do que estipula a legalidade provisória

Quando o que se lê não é exactamente o que se vê


A notícia caiu como uma bomba. Uma sondagem do Le Parisien colocou Marine Le Pen no primeiro lugar das intenções de voto para as próximas eleições presidenciais francesas. Os sinos tocaram a rebate e a notícia percorreu a Europa, anunciando nova ascensão desse bicho maléfico. A líder da terrível extrema-direita racista! O regresso do nazi-fascismo! O drama, a tragédia, o horror! Já estou a imaginar o filme: um novo grande armée em passo de ganso pelos Campos Elísios! Armas químicas usadas nos banlieues. Gregos, irlandeses e portugueses arrastados para campos de trabalho por não cumprirem as metas do défice. A invasão do Magrebe! A 4ª Guerra Mundial logo a seguir!

Como se vê, esta sondagem é um festim para as redacções da imprensa de referência, garantindo análises, debates e avisos mais ou menos enviesados para muitas semanas. A realidade, essa, é diferente. O programa do Front National, por exemplo, não difere muito de um partido de direita conservadora (não confundir com liberal), e a sua praxis está a milhas do sensacionalismo de uma Lega Nord, que participa na coligação governamental italiana. Quanto a Marine, apesar do sonante apelido e da sigla que representa, não é exactamente um Mussolini de saias. Pelo contrário, é conhecida precisamente pela sua moderação e desejo de respeitabilidade, tendo motivado cisões e dissidências entre as alas mais radicais do partido. A esse propósito, resgato o interessante artigo publicado pelo Duarte n'O Diabo no último mês de Janeiro, que cita declarações de Marine sobre o 25 de Abril português: “Na história política de Portugal, Mário Soares teve um papel fundamental, positivo, para o fim do regime, em 1974, e na luta contra o comunismo, a seguir”. Ou ainda: “Sou democrata e respeito a soberania popular: a revolução dos cravos respondeu ao desejo da maioria dos portugueses”. É caso para perguntar onde param os fascistas. A polícia (do pensamento), essa, acho que já todos sabemos onde está.

Ouvido Para as Coisas


Que a crise tem patamares é visível também no tipo de comércio que prevalece. A primeira fase dela consistiu na regressão das boas lojas de vestuário, acessórios e mobiliário, em proveito e benefício das agências bancárias e cabeleireiros: era a altura em que o consumo se canalizava para o efémero e deixava de assentar em disponibilidades imediatas, para recorrer ao crédito. O segundo estádio veio com a degradação dos alvos das compras e traduziu-se no boom das lojecas chinesas de qualidade falhas. Finalmente, o afundamento total surge com a proliferação vigente das casas de compra de ouro usado, tanto na modalidade de reconversão de ourivesarias, como na de criação ex-novum.
A alta aurífera será pretexto para investimento dos particulares, mas não é disso que aqui se trata, o vil metal demandado por esses estabelecimentos raramente assentará em lingotes ou moedas que hajam sido adquiridos como aplicação estudada. O que abunda é uma quantidade enorme de pessoas com anos e dificuldades em proporções concorrentes, dispostas a sacrificar presentes queridos para sobreviver à agressão de um Presente torcinário.
É o drama que se vivia outrora no recurso às casas de penhor e aos leilões de bens trocados em emergência por tostões para o sustento. Tanto mais grave quanto, ao arrancar a segunda pele que era formada pelas lembranças dos afectos e dos triunfos do coração, se aniquilava impiedosamente a parcela de Único que garante uns pós de auto-estima às vítimas do confisco da sorte a quem só restava(m) memória(s) para a manutenção de algum interesse em continuar a viver.
Para ilustrar a comoção tipicamente feminina de semelhante tensão, ensinando-nos a sensibilidade possível ao testemunho dos objectos, em «Drouot», uma vez mais Barbara, para tempos bárbaros.

Edificante

Ouvido esta manhã no centro de Cascais, a um brasileiro que conversava ao telemóvel:

- Mas você falou para mim vim na loja pegar ela...

- Pois é... então agora você pode vim na rua do Poço Novo que eu estou te esperando.

- Poço Novo. Poço Novo.

- Não! Poço Novo!

- Tu não sabe o que é um Poço?

- Pê-ó-éssi-ó! Entendeu? Poço Novo!

Pois agora estes senhores são os donos da nossa língua. Vai aqui o meu abrasso aos Sócrates e Cavacos que nos entregam em tão boas mões.

Contas Furadas

Para quem pense que o responso cavaquista foi um simples mar de words, words, words, talvez seja bom lembrar que as causas dele podem ter assentado num modelo paramatemático. O Presidente terá calculado:
Os Portugueses odeiam Sócrates + Cavaco desanca Sócrates = Os Portugueses amam Cavaco.

Mas suspeito de que, com a hipercontestação que se espraia, a operação corrente será outra:
Sócrates é um político português rejeitado + Cavaco é um político português = Sócrates e Cavaco são políticos rejeitados.


De forma que o apelo ao sobressalto cívico no regime pode bem redundar num cívico salto sobre o regime.

Saudades da Confraria

Desconvocada que está a nossa tertúlia gastronómica-cultural de amanhã, devido ao périplo europeu do — mentor do nosso almoço — Caríssimo Amigo Duarte, começo a sentir um estranho síndroma de carência. E não é só pela falta que o cozido à portuguesa fará ao meu paladar e ao meu estômago, mas muito principalmente por causa da companhia semanal que não terei dos meus Caríssimos Amigos Jovens.

Há noite em Lisboa


Aproveitando o modo francófilo em que este blogue se encontra (pelo menos até amanhã ao fim da tarde), introduzo um interessante artigo da revista Les Inrocks sobre a noite lisboeta e a nova música portuguesa. Resgatando-nos por alguns momentos à profunda depressão das taxas de juro para a qual fomos arrastados, não há nada como ler elogios à boémia do Bairro Alto e às novas bandas do «país das caravelas».

Aforismo Actual

Os Homens da Luta devem-se a gralha. O caminho certo é apontado pelos homens de luto.

Como os desta nossa casa, tendo-se extinto Portugal.

Tirar Partido(s)

Com menor crédito do que a firma Tavares,Marcelo&Sucessores, veio o Prof. Carrilho repisar o apelo à inscrição dos Jovens à rasca nos partidos como o meio aconselhável à intervenção pública. Fico a interrogar-me sobre o que estará a assustar tanto esta gente dos Poderes, já que, na minha desolada previsão, estamos perante um balão que se esvaziará em acto contínuo, após a libertação de alguma raiva reprimida.
Mas prova que o ilustre ex-Candidato à CML não percebe peva do sentir da Mocidade: o que se começa a rejeitar liminarmente é a viciação essencial da classe política, já nem tanto o restrito acesso a ela, pelo que o incitamento sejam como nós não pega, junto de quem pensa e se atreve a dizer temos nojo de vocês.
Pelo que a esperteza de amansar os ímpetos da pouca idade via atribuição de prebendas, para os piores, ou de ilusórias tarefas de melhoramento, meramente de fachada, aos menos maus, deixou de resultar, espero, por não ser já o suborno apetecível.
Não fora a minha aversão atávica às modas, apeteceria soltar a plenos pulmões:
O VOSSO TEMPO PASSOU, PODEROSOS DO INSTANTE!

A Demagogia do Freio

Miguel Sousa Tavares ainda vai sendo dos comentadores a que dispenso minutos de atenção, sem, entretanto, concordar em muito. Mas na Segunda-Feira verificou-se uma total abdicação do sentido crítico. Ao condenar o megaprotesto previsto para dia 12, lançou-se no estribilho da demagogia e da irresponsabilidade para diminuir os projectados participantes nos desfiles contestatários.Conviria lembrar que o demagogo é, por definição, aquele que afecta defender os interesses do Povo com o fim de o dominar. Para isso é forçoso liderar um partido, coisa que a amálgama de explorados e enervados de Sabado vai sendo, justamente, acusada de não ter. Recorde-se, a origem da designação e seu estigma remonta aos chefes do Partido Democrático Ateniense, que durante a Guerra do Peloponeso usavam os apelos patrióticos à Unidade para refrearem as oposições da população, precisamente o mesmo que MST vai fazendo com recurso ao o chavão da responsabilidade.
O cúmulo atingiu-o quando troçou da pretensão dos inconformados em acabar com os financiamentos públicos dos partidos, limitando-os às quotizações partidárias. É perfeitamente lógico que em altura de sacrifícios estes comecem por organizações que dizem servir a população. E se proto-revoltados do dia se dessem conta de quanto custa cada eleição e decidissem ser consequentes com os seus sentimentos, libertos da intoxicação das lições de amestramento, digo, cidadania, seriam estes tristes espectáculos que também se apressariam a atacar.

Eco de Marcos

De Dois: do nosso Querido Amigo que aqui escreve; e do Grande Teorizador que Ele honrou dois postais abaixo e que deixou num volume, vá, de memórias políticas a gratidão associada ao café que Ambos frequentaram, em épocas diferentes. Sob a tutela desejada da Deusa Romana da Renovação celebrada em primaveris estações, a primavera do restabelecimento da sanidade doutrinal foi ali gerada. Mas nem só de Action Française vive a história do estabelecimento, também reside lá a génese do Surrealismo, a que sempre dediquei bons pensamentos, desde que liberto das amarras deturpadoras e castradoras de Breton. Portanto, há que aqui largar um jacto de gratidão que é face ostentada da mais saudável das invejas pela digressão do Caríssimo Expedicionário da juventude desta casa.