Vestir os Que Estão Nus

No Mundo Germânico a nudez sempre fomentou muitas teorias pretensamente regeneradoras don Homem. Nos anos de 1920-1930 lá prosperaram as doutrinas de que a vida quotidiana sem vestes seria um factor de verdade e transparência, mostrando que nada se tinha a esconder, e uma esterilização do erotismo, cuja responsabilidade era atribuída aos trapos que inquietam e deixam entrever. Vá-se lá saber por que razão estimavam esta pretensa qualidade, mas não é isso o que aqui me traz. A iniciativa deste museu austríaco, de abrir um dia para visitantes nudistas de nus masculinos, é uma baralhação: se outrora fazia escola a ideia de que a Arte imita a Vida, tenta-se, do modo mais fácil, propugnar que a Vida imite a Arte. É uma assombração da inocência perdida, que se sugere recuperável pela renúncia às sucessoras industrializadas da folha de parra. E mais uma patética manifestação de igualitarismo, que não percebe estar a entoar um hino à Desigualdade, pois se, nesta época de pronto-a-vestir, as mesmas peças, sublinhadas pelos normativos da Moda, podem indiferenciar um tanto todos os que tenham dinheiro para as comprar, não há volta possível no que toca à comparação dos corpos, por completo diferentes e hierarquizáveis, consoante as medidas, tonalidades, sinais e (im)perfeições. Em vez de ser a Meca da Igualdade, é apenas o Meco dela, o que se coaduna com a lamentável opção nudificadora pelos machos...
                                                  O Anjo Adormecido, de Mariola Bogacki

Costa dos Murmúrios

O Dr. Costa tem, evidentemente, muito mais cabeça e dotes retóricos do que o Secretário-Geral Seguro. Daí que a declaração dúbia que produziu, de só avançar se o actual líder não conseguir unir o Partido, seja uma confirmação de que o virá a fazer. Para já, houve um testar de águas, com a medição da receptividade interna. Por seu turno, os adeptos da direcção vigente espraiaram-se nos desabafos acusatórios da fervura rápida, pois investem-se completamente na esperança de que a governação infame que por aí anda acabe por atirar o País para as mãos do seu chefe, mesmo sem as qualidades do competidor, no que até são capazes de ter razão. O Edil Alfacinha aponta mais alto: que o reconhecimento geral da sua superioridade entre os compatriotas que não fazem parte da entourage do cabecilha se propague aos militantes. A condição de unir é um sofisma, na medida em que é ele próprio que fomenta a divisão quando e como quer, à espera de uma oportunidade para um avanço triunfal, agora reforçado pela aura deste simulado sacrifício. Isto é, crítica aqui, ameaça ali, sonda o ambiente interno. E, se vir o caminho desimpedido, lá vai ele, lançado. Do outro lado, a conversa sobre o espírito de facção é para esquecer. O divisionismo será mau para os partidos, mas não é por eles que estou preocupado: a sua essência é, precisamente, dividir; e, algo muito mais grave, o País. Como também o é a resma de imposições e sacrifícios absurdos para perpetuar a nossa dependência.

Sempre Alerta!

Quanto a mim, podia ser bem pior: imagine-se que em vez de serem gays a quererem entrar (sem sentidos demasiado físicos) nos Escuteiros, fossem os Escuteiros a pedirem para ser contados entre os gays! Fora desta agourenta hipótese, na coisa não se vê pés nem cabeça. Os seguidores de Baden-Powell têm, evidentemente, todo o direito de admitir no seu seio quem muito bem lhes dê na veneta e só uma época completamente perturbada pela ideia fixa do igualitarismo e da uniformização pode pretender o contrário. Assim como se um clube de ruivos tivesse de aceitar morenos porque se meteu na cabeça destes integrá-lo. Ou pior, porque se ainda se compreende o esforço para evitar distinções segregadoras em função de características não-escolhidas, como raça ou classe de nascimento, proscrevê-las quando fundadas em apreciações negativas da acção de outrem, em última análise, levaria à própria forçada aceitação pseudo-prazenteira da generalidade dos criminosos. Não pertencendo, ou tendo alguma vez pertencido, a qualquer dos dois grupos envolvidos, sinto-me capaz de dar uma opinião independente. E de chamar a atenção para um perigo óbvio: sabendo-se da preponderância dos pederastas no meio pedófilo, receber portadores dessas tendências como líderes dos rapazinhos não será trazer a gasolina ao fogo?
Temo que esta passe a ser uma imagem definitamente datada.

Aviso aos Leitores

O Diabo, semanário fundado por Vera Lagoa e actualmente dirigido por Duarte Branquinho, traz publicado, na sua edição de hoje, mais um artigo cultural, sobre cinema, da minha autoria.

O Desastre Reflectido

Num País tão atestadamente deprimido como comprova o record batido da compra de anti-depressivos, a ambiguidade tremenda sobressai de um fatídico acidente como o de ontem. Num primeiro momento, a perversidade do despertar dum renovado interesse em face da infelicidade mais extrema, a acordar do torpor em que nos fazem mirrar. Depois, o novo mergulho na dolorida e difusa incapacidade de reagir, ao compenetrar-se da impotência para inverter a desgraça e da parcela a adicionar ao mal do tempo. O pior de tudo, entretanto, seria deixarmo-nos escorregar para a arrogância da comoção com base no sentimento genuinamente bom, aquela que nos incitasse a lamentar comparativamente o fim terreno de Pessoas Sãs que pretendiam empreender uma espécie de peregrinação, junto de um Presépio, quer dizer um resquício de Culto, enquanto tanto patife goza e prospera. Nessa compreensível mas condenada avocação do poder de decidir de quem por cá continue jaz a mais perigosa das tentações que nos possam perder. Evitêmo-la, diante do horror e das devidas condolências que, pela dimensão, creio nos menos maus muito acima da mera formalidade. Mas insistamos na equação de cada óbito na sua dimensão absoluta de personalidade!
Uma única nota: «um autocarro antigo e sem cintos de segurança» não parece igualmente uma descrição do Portugal em que vamos permanecendo à espera de perecer?
                                              Payola no Fim do Arco-Íris, de Michael Scott

Armas e Armaduras

Leitura muito consoladora da obra de Pedro Calafate «DA ORIGEM POPULAR DO PODER AO DIREITO DE RESISTÊNCIA», onde visitamos a sabedoria dos nossos antigos tratadistas, vários dos quais faziam radicar a Legitimidade do Poder na cedência dele ao Príncipe in actu, e não in habitu, quer dizer, para o exercício correcto de uma função em prol de todos e não com base numa transcendência permissiva de actuação arbitrária. O que tinha o condão de couraçar a Comunidade e permitir, em circunstâncias graves e extremas de desvio, a retoma da instituição electiva pessoal na base dinástica, bem diferente da compulsiva alea presente nas escolhas de ementas restritas que hoje se fazem profusamente, por tudo e por nada, abrindo caminho para os triunfos precários e desilusões da irresponsabilidade do ciclo infernal da promessa, desperdício e sucção de concessões aos mais expostos. Na borrasca que atravessamos, talvez fosse bom ir pensando em desencadear a ruptura constitucional que se impõe, voltando a um sistema provado que se oferecia como argamassa ligando o Passado ao Futuro e em que o Presente era erguido sobre o equilíbrio da Finalidade e da Vigilância, em vez do cheque em branco que, em nome de uma manifestação de vontade contingente e efémera mas espartilhada por partidos, vai eternizando as alternâncias de clones unidos na rota transviada de estragar o que resta. Os Anarquistas tinham razão: Se o voto é a arma do Povo, quando votaste ficaste desarmado.
A imagem é Fundação de Portugal e Aclamação de D. Afonso Henriques, de Antonio Fernandez

Festa Pelo Lombo

Não me parece ser grande encómio a apreciação do Sr. Westerwelle. Dizer que estamos a caminho de ser um caso mais bem sucedido do que antes da intervenção tripartida que nos condiciona terá algum significado, quando o termo de comparação era o fracasso total? E, cheio da insensibilidade liberalona de sempre ao sofrimento dos indefesos, o ex-líder da pequena bengala amarela da cega Sr.ª Merkel, o FDP, parece-se sinistramente com o Galego que treinava o cavalo para não comer e se admirou de que quando ele estava quase ensinado de todo tivesse morrido... Se os sacrifícios fossem exigidos para nos emanciparmos de tutelas do género, seria uma coisa, como na oposição ao empréstimo externo protagonizada por Salazar em 1928. Impô-los para eternizar a submissão é a machadada final na dignidade de um País antigo que de vez se conformou com a condição de pedinte e a arrogância dos que dão sem desinteresse, mas que nem o faz como o modelo clássico, para salvaguardar o sustento da família.
                                                   O Pedinte, de Jules Bastien-Lepage

A Tracção Fatal

A História Franco-Mexicana está pejada de aspectos lúgubres, como a exportação das ideias da Revolução Francesa e a intervenção imperialista de Napoleão III, pelo que a emigração para o País Americano de uma protocriminosa, considerando a omnipresença da violência por aquelas paragens, não pareceria trazer grande acrescento. Por muito suspeitas e reprováveis que sejam os expedientes rápidos e irregulares da respectiva Polícia e máquina judicial, nada parecido com esta celeuma teria, provavelmente, sido despoletado, não fora o empolamento tão tipicamente gaulês quando está a ser condenado por outrem um seu cidadão. Mesmo num caso em que não parece haver incerteza e de que só a intensidade paranóica da negação alimenta fogachos de vitimizações, o relevo deve ser colocado, inteirinho, nas forças que puxam para as primeiras páginas um caso que se imagina longe de ser único: as paixões que terão conduzido uma rapariga à participação em actos repelentes e governantes a desencadearem o que, descontadas as roupagens do respeito pela Legalidade, se reduz a uma efectiva defesa dela: a amorosa e a nacional. Sob a capa dos direitos dos arguidos emerge uma vez mais entranhada desculpação que se alicerça nos sentimentos amorosos e na compreensão pelos desvairos a que conduzem, para desespero das vítimas privadas do consolo de ver punidos os responsáveis pelo seu sofrimento, mas sim celebrados pela solidariedade impensada do patriotismo superficial e fácil. O Romantismo Acabou? Quem disse?

A Tirania dos Números

Quem não aceite as razões do Sr. Cameron como espelho fiel das respectivas motivações pode enveredar por uma leitura preconceituosa mas com apoios históricos, a de o Reino Unido encarar a saída da União Europeia por a crise ter demonstrado já não ser necessária a sua permanência nela para a destruir a partir de dentro. Contudo, tal perspectiva enferma de uma hipervalorização do Político que pressupõe uma teleologia dificilmente pensável na dimensão dos governantes gestores de hoje. É mais provável que os motivos que informam a decisão assentem em valores contabilizáveis, sim, mas, num patamar anterior ao económico-financeiro: o de esvaziar eleitoralmente os votos de parcela significativa da População Insular que, escapando para o UKIP, a sigla eurocéptica radical, tornasse ciclópica a tarefa tory de conseguir, por si só, uma maioria em Westminster. É, portanto, palavreado para consumo interno, adulação dos votantes, fazendo-os pensar que decidem e participam directamente da e na soberania nacional, não já alienável por intermédio da representação.
                                                      John Bull e o Seu Cão

A Força Das Convicções

A Economia vai tendo coisas destas. Depois do "especialista" sem credenciais verdadeiras, dão-nos um outro, credenciado, mas sem verdadeiras ideias. Ou melhor, portador das que lhe convenham à conta bancária. Se é uma fundação socialista a encomendar, vai uma solução expansionista. Quando trabalha para o FMI, salta um relatório pejado de cortes recomendados. Já nem as mulas são como as de antigamente! No milagre de Santo António, o equídeo, privado de comida durante três dias, desdenhou o alimento físico para se virar para o Santíssimo Sacramento, propiciando a conversão do dono. Mulas de agora já não teimam e, docilmente, alinham no que aos patrões agrade, com estudos à medida e nomes falsos a camuflar as contradições entre pareceres da mesma origem. Equídeos por equídeos, somos todos nós os burros que com cargas constantemente aumentadas ainda damos crédito a peritagens dum tal quilate.
                                      O Milagre da Mula, de St.º António de Pádua
                                                   por Joseph Heintz O Jovem

À Coca:


Tomou-se de virtude a Coca-Cola, como desde as origens se tenta impingir. Os começos refastelaram-se na caução de um farmacêutico, o Dr. John Pemberton, seu inventor, que vem, desde aí, sendo alvo de culto, com estátua erigida e tudo. A minha experiência em torno dela associa-a a coisas negativas, pois, bebendo-a como a generalidade dos pirralhos, deixei de o fazer aos doze anos, quando o meu Pai me disse que, a partir daí, já um homenzinho, me deixasse de tomar aquelas coisas e passasse a meio copito de tinto, às refeições. Quanto à obesidade, penso, como é habitual em tantos domínios, ser o abuso e não o uso que acarreta os efeitos nocivos. Conheci nestes anos todos muita gente que se deliciava nela e permanecia elegantíssima. Tendo a crer que o mal está na companhia, a combinação com doses quase tão industriais como o tipo de hamburgers, batatas fritas e pipocas com que se empanturram os adolescentes Americanos. E nas campanhas contra o alcoolismo, as quais, em vez de aconselharem o consumo moderado, incitam à substituição incontinente por xaropadas açucaradas. A presente ofensiva publicitária é consistente com o que sempre fez, alterações de fórmulas ao sabor das pressões dos denunciantes das suas falhas, ao ponto de o original ser uma remota referência, mas não traduzindo esse aggiornamento qualquer contrição profunda. Por mim, o produto encontrou em Portugal o amigo e o Inimigo que o definem: Humberto Delgado, pelos Comunistas apodado de General Coca Cola; e Salazar que, tendo resistido às influências para a permitir no espaço luso europeu, depois de a provar, terá exclamado: ainda por cima é uma porcaria!
A imagem é a da Solidão, de Tony Ignatov...

O Choque Em Cadeias

A cobertura televisiva do acidente ferroviário de ontem trouxe-nos absurdos vários, como absurda parece ter sido, nas previsões, a possibilidade do desastre, tantas eram as seguranças sinaléticas e computorizadas que afastavam o cenário. Eu sei que é difícil fazer passar à frente da bola alguma coisa, mas o mínimo que a SIC poderia ter feito era interromper de imediato os comentários  para encher do trio político-futebolista que lhe ocupa as noites de Segunda, à maneira do que a TVI fez, em vez de descansar sobre o frenesi do rodapé informativo, durante largo tempo. Mas não se pense que a sua concorrente esteve imaculada: enquanto as outras cadeias havia muito tinham sossegado o País quanto à inexistência de mortes ou feridos de muita gravidade, ela continuava a insistir irresponsavelmente na aterrorizante possibilidade dos óbitos. Numa e noutra, de resto, ouvi estar envolvida uma terceira composição que parece ter surgido somente da bulimia informativa. Agora que a Tragédia maior se não confirma, tenho de reflectir em como a descrição do acidente espelha bem a condução do País - metida a água nos carris com os orçamentos a deslizar e acelerando-se inescapavelmente nos trilhos do incumprimento, acabam os inocentes transportados por ver entrar-lhes pela traseira toda uma locomotiva em descontrolo. Esperemos que não fosse da sinalização impotente a tal luz que o Dr. Passos lobrigou ao fundo do túnel embora já todos saibamos que isso, como o espalhafato televisivo das coberturas sem exactidão, se resume a música para nos entreter.
                                               O Comboio Mistério, de Nick Cudworth

O Diabo


Aqui fica a capa d'O Diabo de hoje, onde sai um artigo do João, como ele já avisou, e muito mais. 

Suspense...

O Diabo, semanário fundado por Vera Lagoa e actualmente dirigido pelo nosso ilustre confrade Duarte Branquinho, trará amanhã publicado um artigo deste vosso humilde escriba.

A Gaia Vivência

O Dr. Menezes teve sucesso em demonstrar trabalho, mas descamba de cada vez que tenta mostrar-se visionário. A proposta de fusão de Vila Nova de Gaia com o Porto é de fugir, sob todos os pontos de vista. Primeiro porque é querer derrubar a fronteira natural do Rio Douro, assim uma coisa tão descabida como se o Dr. Costa viesse pugnar pela osmose de Lisboa e Almada. Segundo, porque a articulação das resoluções dos problemas da zona deve ter lugar nos orgãos da Área Metropolitana, para tanto criada. Outro entendimento traduziria uma situação de desfavor para os demais concelhos que a integram. Terceiro, porque se gerou, com os anos, uma identidade própria, apesar da interacção com a Capital do Norte, desde as segundas residências de outrora, ao dormitório não tão despersonalizado como outros, dos dias que correm, nem valendo o Vinho como factor aglutinador, ou correr-se-ia o risco de ter de anexar toda a costa produtora do Alto Douro. Mas, acima de tudo, porque a sugestão configuraria mais um prego no caixão da descentralização e das Liberdades Municipais. Em 1834, os Liberais iracundos já tinham obrigado à compressão de Vila Nova com Gaia, qualquer delas senhora de História própria. No momento, é a submissão à Cidade Maior que está na ordem do dia. Eu ainda espero que seja apenas uma tentativa meramente vocal de reiterar o amor pela terra que regeu durante os últimos anos. Pior seria se fosse um frete aos ímpetos anti-municipalistas do Governo, cujo P-M tanto apoiou, quer dizer, uma inclinação adicional à opressão administrativo-financeira provinda dos programas do Exterior.

Branqueamentos

Afinal, o sucesso pode advir da inconsideração: dizem-nos que o Viagra faz emagrecer, combatendo a flacidez, o que significa que trata a gordura da mesma forma que o músculo, ou, pelo menos, um dentre eles, causa até ao momento da sua celebridade. Mas um céptico chatíssimo como eu gostaria de ver mais detalhados os processos, tendo em conta o passado do medicamento. A dúvida que me vai corroendo reside na incerteza sobre se se cinge a uma reacção puramente química, ou se será o aumento da actividade sexual que, exercício de eleição, levará ao adelgaçar das adiposidades. Caso em que a transformação da gordura branca em beije prefiguraria um paradoxal branqueamento, melhor ilustrado pelas cobaiazinhas alvas metamorfoseadas que disfarçariam assim a acção mais reconhecida dos comprimidos azuis. Simplesmente, daqui em diante, vou ver muito cavalheiro necessitado da ministração do fármaco para ganhar centímetros afiançar, liberto de vergonhas, que o compra para perdê-los... É um golpe publicitário genial!

O Golpe de Misericórdia

Era uma vez uma Condição venerada por quase todos, fossem ou não sensíveis ao maravilhamento que o estatuto de Mãe exalava. É que mesmo aqueles que, pelos azares da vida, não preenchiam as condições para a ternura e gratidão de que até os animais mais sãos, ditos irracionais, não prescindem percebiam a importância social da função, a intangível hipótese de continuidade dos grupos. Até que veio o Progresso. E deu em impor às Mulheres a competição no terreno até aí resevado aos homens, mas deixando-as entre a espada e a parede de optar pela realização profissional ou pela dedicação aos filhos. Ainda assim a Maternidade resistiu. Assestaram-lhe nova cutilada, lutando para que uma criança possa ter dois pais, dispensando a Mãe, com os casamentos gay. A Coisa vai abanando,, mas ainda não caiu. Vem, enfim, o Fundo tentar atirar-nos para o dito, ao propor a tributação dos subsídios de maternidade. Como é do mais elementar senso político dar benefícios fiscais a actividades que se visa fomentar, só se pode concluir que esta é uma que eles querem restringir. Apesar da crescente raridade dos nascimentos, devem estar fulos por ainda haver alguns partos atrevidos! Não quero perder tempo a qualificar estes especialistas. Falando a única linguagem que eles percebem, apenas perguntarei onde pretendem vir a achar quem, no Futuro, faça os descontos que lhes pagarão as reformas...
                                                      Maternidade, de Eugène Carrière

O Preço Certo

É mais que natural! Haverá quem se admire deste preço, mas porquê, Senhores? Não é um artigo roubado? É-o, pertencia à Ordem de S. Bento, a grande Conservadora da Cultura Europeia. Não foi abrigo último de agentes do Estrangeiro? Foi-o, com a construção lá ordenada das criptas que albergassem a Família do Cristovão de Moura que tão fielmente serviu Filipe II de Espanha, antes de ser I de Portugal, como continua a ser das correias de transmissão de Bruxelas, Berlim e Internacionais para vários paladares, hoje por hoje, numa altura em que fora do edifício ninguém mais respeita o seu recheio. Não prejudica a saúde? Prejudica, tem de ser por completo desinfectado, pois é o foco principal da epidemia de abatimento que está a vitimar o País, o que já se previa desde que truncaram o nome antigo, Mosteiro de São Bento da Saúde. Mas claro que o Denunciador que despoletou este reconhecimento quis, acima de tudo, mostrar como são iguais, na qualidade de fontes da nossa desgraça, a moeda e as leis que nos oprimem.
                                                     Antes da vocação paralamentar

A Confiança LANCEtada

Eu respeito o arrependimento. Do remorso de grandes pecadores nasceram enormes Santos, começando por Aquele de Tarso de que carrego o nome próprio, Mas no caso de Lance Armstrong, não duvidando da sinceridade, quereria vê-lo mais consequente. Não basta a confissão das entrevistas, deveria devolver tudo o que ganhou nas competições aldrabadas. Não só os troféus, mas, igualmente, as retribuições pecuniárias que auferiu. Teria uma vida dura? Decerto. Mas seria parca penitência para tão grande falta. E não é o que vejo. Ao mesmo tempo que admite as suas culpas, diz que todos o faziam, tentando mitigá-las. Nunca as falhas dos outros são legitmação das nossas, mas, no caso dele, pior, pois construiu uma imagem granjeadora de simpatias pela vitória sobre a doença, sem referir que recorria a medicamentos para fins muito menos nobres, quer dizer para batota cuspida e escarrada. Se tiver razão, sugiro que dêem as medalhas e taças dele e dos seus concorretes aos "médicos" que os prepararam, mas nem é disso que se trata. O que sobressai é a traição a sucessivas vagas de admiradores, tantos deles jovens, que depositaram a confiança nos seus êxitos desportivos como salva-vidas da relativa pureza a sobreviver na sociedade sem Honra desta contemporaneidade atroz. Portanto, rogo-lhe, não queira, como afirma, voltar às competições, a sua própria Pátria edificou, na respectiva História, um assento diferente do selim, para ser usado pelos batoteiros:

Eu Diria Mesmo Mais...

O Senhor Hollande acha que os cortes orçamentais não devem incidir sobre certa categoria de fundos e claro que o interessado Coelho diz precisamente o mesmo. O problema reside na irrelevância das personagens. A que resulta da perda de importância dos Países que tragicamente vieram a fingir representar, mas, igualmente, a da falta de envergadura dos próprios. Portugal, na versão das adesões às Comunidades, mal saído do PREC, era uma amante carota que os grandes da Europa tinham por conta, com o intuito de impedir novas emancipações da partidocracia que impõem. Hoje, não passa de um moço de recados a que se dá ordens em tom ríspido e a que se censura a mandrice. A França era o membro do casal que fazia mover a Europa e o único que vaga e imaginosamente podia passar por vencedor da Guerra, coisa sempre posta na ponta da língua dos respectivos presidentes, para deixar em sentido de submissão às fantasias que a consolavam o Parceiro Germânico. Tudo isso acabou, por obra e desgraça das opções deficitárias. Nem as possíveis mudanças de regime de um, nem as censuras de perturbação da paz europeia de outro metem agora medo a quem tem a pasta na mão. Para cúmulo, o que estes gémeos siameses dizem não se escreve. Um já falhou mais previsões de equilíbrio do que uma constituição saudável permite, o que nem é o caso da da República. O outro entrou a gritar exigências de crescimento, para meter entre as pernas o rabo, com o aumento em massa dos despedimentos na emblemática indústria automóvel, tendo a Renault a protagonizar as últimas parangonas. Ambos encontraram a Revelação no soturno encorajamento à expatriação das vítimas do seu jugo: O Dr. Passos manda emigrar os pobres, nem que seja para os Quintos dos Infernos, o locatário do Eliseu faz debandar os ricos para a Rússia, essa Quinta de todos os Invernos. A Sr.ª Merkel arranjou uma dupla com pinta de gauleiter sem ter de recorrer a empresas de outsourcing.

O Fim de Um Mundo

Na Alta Idade Média o livro integrava o conceito de tesouro e era (res)guardado nas arcas e cofres a sete chaves cerrados, conjuntamente com os ouros e pedrarias que davam expressão à riqueza. Com este desenvolvimento chega-se a um estádio mais avançado dum processo de desvalorização, muito maior do que o da moeda. Com a disponibilização no monitor de obras para todos os gostos consegue-se, decerto, uma magnífica ferramenta de trabalho e é salvaguardado e fomentado o essencial, a saber a comunicação dos espíritos, vencendo barreiras de tempos, lugares e preços. Mas fica irremediavelmente prejudicado o encanto da busca entre estantes sedutoramente misteriosas da revelação que nos cure da depressão quotidiana, como no quadro Biblioteca, de Pierre-Luc Bartoli:
A inovação é a face que corresponde à Época: Ao critério da produtividade sacrifica-se a alegria e os alfarrábios deliciosamente poeirentos deixam de ser um abrigo contra a agressão que nos rodeia. A consulta computorizada faz-nos escravos do consumo dum texto exibido em frente, sem a contrapartida do maravilhamento do descobridor que erguia um padrão em cada ficha que requisitava um volume. E, passando para as bibliotecas privadas, que coisa mais cusca e sensaborona, a de perscrutar intrometidamente um catálogo, em vez de aumentar a cumplicidade com um anfitrião, no meio de conversa ociosa, percorrendo com o olhar os afectos comuns que lhe preenchem as prateleiras...

A Lacrimosa Falácia

O Prof. Freitas sabe as responsabilidades que tem na instauração do regime, pelo que uma declaração destas só pode significar a fuga para a frente, na tentativa de escapar ao incómodo do arrependimento. A Língua é uma coisa muito traiçoeira, mas fazer por acreditar que a saída para o País repousa no acrescento de um ditongo que junte velha receita a uma fonética próxima da conjugação do verbo dizer é fantasia forçada, a de querer fazer da dissolução a solução. Só pode passar pela cabeça de quem, muitos anos atrás, inundou todos os cantos do Rectângulo & Ilhas com uma brochurazita a garantir que tinha uma no bolso, mas a prescrição é sempre a mesma e contraproducente: "novas eleições, outras eleições e mais eleições", para entreter, gastando mais uns milhões, adiando eternamente a consciência do âmago do falhanço e querendo ver nas causas do problema a maneira de o resolver. Foram as eleições que puseram esta gente na (mal)feitoria a que estamos sujeitos, pelo que um verdadeiro arrepiar de caminho não pode continuar a ser o mesmo caminho de arrepiar. Os Partidos deram-nos como capatazes à la carte os frutos das respectivas Juventudes, mal saídos da idade do armário, é certo. E continuam nessa lastimável senda. Mas quem criou instituições e alienações da Soberania que os permitissem como gerentes a soldo da Estranja foram o Senhor Professor e os Seus Pares. Este apelo ao actual ocupante de Belém é, mais do que uma adicional mordedura da mão que o alimentou, uma patética tentativa de lembrar que quisera o cargo e, assim, arrogar-se uma autoridade para pontuar a maneira de exercê-lo. E, quem sabe se, lá no íntimo, não querer lembrar que ainda está vivo, logo disponível para mais uma corridinha a apresentar como sacrifício? Pelo despeito ou pela ambição, as lágrimas dali provenientes serão sempre de crocodilo, enquanto que o Transcendente Amor a esta tão maltratada terra as volta, enfaticamente, a jorrar de sangue. Agravadas pela reiterada impostura de ser Obrigado a assistir ao espectáculo lúgubre de fazer passar por soberano um Povo quando a Soberania, roubada a Reis, Leis, cunhagens, controlos e decisões, apenas sobrevive na Dívida.
                                                             Dissolução, de Oleg Togyopin

Na Saúde e na Doença...

Sou profundamente arredio a concordâncias com a opinião do ex-Secretário de Estado Pizarro, de um Serviço Nacional de Saúde excluir a lógica de um subsistema à parte para os Funcionários do Estado. Não sendo, nem tendo a mínima perspectiva de ser, um deles, acho que cada País deve recrutar para os seus serviços um grupo a que exija mais mas a que, numa recíprocidade de compromisso, atribua privilégios, embora as queixas que oiço acerca da ADSE dificilmente a possam manter entre aqueles. Jamais se deveria impingir o concurso para a Função Pública como um direito universal, antes os seus integrantes deveriam ser recrutados entre os que tivessem opções de conduta e presença na sociedade concordes com a dominante na Colectividade. O Estado deve indicar um caminho que prefere, pescando nos que o seguem as peças da sua máquina e outorgando-lhes compensações superiores às do vulgo, enfim, criar um Escol. O problema é que a cúpula que poderia conduzir um processo de selecção como o enunciado não tem unhas para tocar essa guitarra. E, só pensando em ganhos imediatos, está, como sempre é via fácil, a igualar por baixo, transformando cada vez mais, para todos os Portugueses, inclusivé os seus braços, a Saúde num fruto proibido. Que, ainda por cima, com o desgosto contínuo que a situação geral da Nação nos imprime, como factor de extensão da nossa passagem neste mundo em queda livre, cada vez é, ai de nós, menos apetecido.

Nos 80 Anos d'«A Canção de Lisboa»

O Diabo, semanário superiormente dirigido pelo nosso ilustre confrade Duarte Branquinho, traz hoje um artigo deste vosso humilde escriba.

Hoje Não, Querida!

Ora, vamos lá aos factos d(est)a vida: parece impossível como sexólogos e outros estudiosos das circunstâncias íntimas se deixam enganar por evidentes fórmulas de polidez. Quando os homens portugueses dizem que estão cansados, para justificarem a falta de apetite sexual, estamos perante uma versão actualizada segundo a Igualdade dos Sexos da clássica recusa feminina com a invocação de uma enxaqueca que impediria a redução do feio vocábulo à sua mais apetitosa metade. Como também parece estranho que se confessem consumidos por uma actividade de estudo vergonhosa, a partir de certos estratos culturais, a da Pornografia, para justificarem insuficiências de performance... Semelhante admissão só se percebe se visar esconder coisa ainda mais infamante. E o que poderá ser? Ora, claro que uma infidelidade é a principal suspeita. Como se vê, não faltam as pistas. Para chegar aos elementos de prova, basta ler os jornais, os machos lusos estão a ser vítimas constantes de um assédio contra o qual não conseguem reunir forças para resistir. É o dos políticos que, em todas as horas de vigília, se servem da posição de poder que detêm dentro da comunidade para os obrigar a satisfazer-lhes os desejos, na pele de sujeitos passivos. Que admira, após tanta actividade forçada e traumática, que lhes falte a vontade no concernente às caras-metades e a coragem para revelar a verdadeira razão?
                                          Horizontalmente Com Duas Muletas, de Maria Lassnig

Astros do Ensino

Correio urgente para o Ministro Crato: à frente de um Ministério cuja mais notória característica vem sendo a importação cega de modelos estrangeiros, veja-se o absurdo do caso Finlandês, urge, pelas últimas notícias, dar atenção ao que em prol do aproveitamento escolar se faz numa milenaríssima Civilização a que, para mais, estamos danadinhos por nos vender. Na China descobriu-se que alinhar os alunos pelos signos astrológicos ocidentais dava resultados magníficos, sem achar que uma quejanda cedência ao outro hemisfério fosse uma colaboração de maior com o Imperialismo. E na Universidade, pasme-se, um espaço em que o cepticismo quanto aos condicionamentos estelares seria mais que previsível! Temo que por cá não se ligue meia, não pelo descrédito da leitura das estrelas e planetas, mas porque a magnética fascinaçãoção pelo Exótico se verá esterilizada pelo boomerang que reenvia para as nossas interpretações siderais. Quanto à "coisa em si", parece-me mais de contentarmo-nos com o chão conhecimento do Homem: os Universitários chineses viram a curiosidade pelos colegas embotada pela noção de que tinham sido enfileirados com mais do mesmo que sobejamente julgavam conhecer e, desiludidos e privados da consabida atracção dos opostos, viraram os olhos para as sebentas. Pode a receita funcionar? Talvez. Mas será aceitável nesta sociedadezinha de pele sensível uma segregação com base nas origens astrais, quando são proscritas até ao absurdo as considerações raciais, de nível económico e social e de capacidade intelectual? Será este apartheid mais tolerável? Uma resposta com os pés bem assentes na terra dir-nos-ia do ilogismo da afirmativa, mas chegou-se a um estado de desespero com a parca valia dos diplomas que qualquer alucinado caminho pode parecer uma esperança.
                                                    Personificação da Astrologia, por Guercino

Desagravo

Em época de sorriso amarelo, do Castelhano para o Português, está na ordem do dia evitar que se sobrecarregue com pecados muito para além dos autênticos uma classe profissional cuja má fama dispensa difamações:

Rajadas de Horror

Sobre a tranca na porta que Jo Biden e os seus conselheiros arranjaram agora contra a casa roubada da violência em massa, a de fazer a Indústria rever o conteúdo dos videojogos, não obstante o aparato tecnológico, continua a não haver coisa nova debaixo do Sol, confirmando o alerta bíblico: a discussão sobre se manifestações menos suaves do entretenimento funcionam como incitação a condutas reprováveis, ou, pelo contrário, como catarse que as evite, perde-se na noite dos tempos e é conhecida, pelo menos, desde os comentários à Tragédia Grega por alguns contemporâneos de nome e valia.
Neste caso, até me parece que a viciação em tamanho exagero de passatempos de destreza pode despertar vocações de mass killers adormecidas, porque convida à colecção de maiores tiros certeiros possível e apresenta continuadamente os alvos a acumular com a desumanização total que esbate os mecanismos de refreamento e reflexão passíveis de conter o atirador, quando na mira estejam seres em carne e osso. Mas não sejamos lestos a diluir culpas pessoais e intransmissíveis, cada monstruoso disparador de armas reais tem de ter em si o germen do Mal, mesmo numa sociedade que vê e elogia a presença das simulações do assassínio como uma lúdica e aceite diversão, um pouco como que escape masturbatório que dispense da interacção estimulante da reconhecibilidade do Humano no que de menos mau ainda consiga exibir e apelar.
                                                           Jokers I, de Migle Kosinskaite

A Nota Dó

Parece, a todos os títulos, pouco feliz esta escolha do BCE. É que se a razão para as novas notas for, como adianta, a segurança, não faz qualquer sentido a opção pela Figura Mitilógica da Europa, passada à História como conivente deliciada com o que começara por ser o seu rapto e violação. Quererá o Sr. Draghi valer-se do simbolismo para se predispor à cumplicidade com os falsários? O problema é mais vasto e já António Sardinha em «ROUBO DE EUROPA» poetara sobre o assunto: o da docilidade deleitada com que o Continente convive com o desvio dos seus valores. Nesse sentido, também o entusiasmo em redor da «diversidade» que o novo meio de pagamento pretende consagrar não parece o mais acertado, pois um apelo consequente a uma União mais que nominal deveria, ao invés, sublinhar factores de coesão, em vez de evocar multiplicidades fragmentárias. Quanto à questão grega da consagração da origem da crise, creio lá bem enraizada no inconsciente dos autores da escolha  uma entrega ao exorcismo - pela invocação de divindades Helénicas expulsar as fraquezas induzidas no euro pelos humanos da mesma nacionalidade.
                                                               O olhar de Ticiano

A Vã Glória?

Para que não estranhem os Amigos o meu silêncio sobre o caso enebriante da Deputada Glória Araújo, cá venho ao tema. E para defender a Senhora! Não há que estranhar que uma Integrante da Comissão de Ética do Paralamento se tenha conduzido com tal grau de intoxicação, pois apenas consubstanciou mais um episódio da célebre «Ética Republicana» que, desde há muito, venho demonstrando ser uma bebedeira pegada. Talvez seja a tentativa de camuflar a contaminação que leva agora à publicitação pressurosa dos levantamentos de imunidade. E ninguém pode censurar a Jovem Legisladora por seguir à risca e com risco a fórmula de Brel, que a liberta de rancores tão comuns à classe política que integra e de tristezas que, como se sabe, não pagam Dívida(s).

Árvore da Sabedoria

Neste Natal de tristezas acrescidas, uma decoração me prendeu, em especial: a da Biblioteca Municipal de Cascais, a qual bem comporta o nome idêntico à do Antigo Testamento. Todavia, não por atrair à degustação dos respectivos frutos em função das ambições transformadoras que enganosamente se dissessem capazes de fazer a Espécie superar-se e igualar o Inigualável; sim, pelo esforço de cultivo da terra arável que é o Espírito, de forma a crescer, compenetrada da respectiva condição. Infelizmente, numas poucas conversas que ouvi, a motivação principal da requisição de livros, nestes tempos do fim, não vai sendo tanto a progressão interior que dignifique, mas a busca de consolo que abstraia das cada vez maiores dificuldades e contingências. Para um velho amante deles, todos os caminhos serão bons para chegar ao Livro. Mas não chegará a monomania da produtividade e da ampliação das Receita com estratagemas fáceis à tentação de impor taxas moderadoras também neste campo? O que talvez se revelasse muito mais desincentivador do que a primeva proibição do Fruto. Seja como for, acabei por encontrar uma similitude, onde, primeiramente, só me saltaram à vista diversidades: quer pelo conhecimento do Mal de outrora, quer pelo sofrimento da desilusão inerente à Experiência que suportamos e busca do lenitivo, qualquer das duas plantadas imponências nos compenetrou duma perda da inocência.

A Jeito Para o Cutelo

Não exerço qualquer das profissões apontadas, nem tenho interesses familiares que condicionem o meu juízo. Pelo que me sinto à vontade para exprimir a minha revolta contra a vulnerabilidade a que chegámos, nem tanto a entrevista na facilidade com que certos senhores de fora se permitem sugerir cortes que afectam as vidas de vastíssimos estratos profissionais, mas, sobretudo, na sobranceria com que, sem paninhos quentes, dizem excessivas as retribuições que eles auferem. É a triste consequência de, neste Jardim à beira-mar plantado, a condição Soberana ter passado a ser monopólio da Dívida.
                                              A Loja dos Carniceiros, de Anibale Carracci

Que Espectáculo!

Daqui para a frente, Incrível Almadense deveria deixar de ser a designação de uma histórica sociedade recreativa do outro lado do Tejo, para passar a referir-se ao tribunal que produziu esta brilhante decisão. Nada tenho contra os shows eróticos, meio de empregar gente com qualificações específicas e de fazer andar a Economia. Mas não posso deixar de reconhecer que o espírito reformulador dos magistrados envolvidos vai muito além das aventuras linguísticas do Presidente Bill Clinton, embora na vertente puramente platónica. O Político Norte-Americano determinara que sexo oral não é sexo. Os Meretíssimos Juízes vêm sentenciar que uma exibição de sexo ao vivo não tem natureza sexual, ao aceitarem a argumentação nesse sentido com que a empresa interessada maltratou o labor dos seus funcionários. Fora eu um dos artistas envolvidos e zangar-me-ia a sério. Não sou. E só posso dar e achar graças a um País que tributa a oferta de alimentação a 23% e coloca a taxa do Erotismo a Cinco. O que uma vez mais é insultuoso para os protagonistas, na medida em que não reconhece à sua actividade o estatuto de Restauração, mesmo se os olhos também comem...
                                                        O Juíz, de Jackie Morris

Sem Emenda

Muitas preocupações tenho visto acerca da revogação da 22ª Emenda Constitucional Norte-Americana, no sentido de remover o limite de duas eleições presidenciais possibilitadas a cada indivíduo. A iniciativa mais recente não tem pernas para andar, porque o Legislador do Bronx Serrano não possui peso para abalos sistémicos deste calibre e porque o processo de adopção de alterações destas, nas duas câmaras e nos estados, é tão exigente que não se vê maneira de vingar. A única esperança seria o facto de os líderes Democrata e Republicano no Senado e o Líder Democrata entre os Representantes, Harry Reid, Mitch McConnell e Stenny Hoyer serem receptivos à modificação. Outrora, o limite de mandatos era uma bandeira da Esquerda, com Jefferson a identificar a sua falta como a «consagração da tirania». Hoje, é um dos pontos de honra dos mais extremados e populistas Conservadores Republicanos, os quais se fazem amiúde eleger com compromissos pessoais de não se candidatarem ao Congresso mais do que X vezes e impuseram limitações de reeleição nas normas de muitas legislaturas estaduais. No que toca à Presidência, sempre se tinha entendido que, entre cavalheiros, haveria a cortesia de não disputar outra eleição depois de dois êxitos, até que Franklin Roosevelt mandou às malvas uma noção tão rarefeita de fair play e abarbatou quatro vitórias. Foi o cansaço transbordado para o seu sucessor Truman que permitiu, com a perspectiva da cavalgada do Herói da Guerra Eisenhower à mistura, a proibição de governações pessoais mais prolongadas.
Os Democratas não esbracejaram demasiado porque não tinham, desde aí, um re-candidato em condições: Kennedy terminou à bala, Johnson nem procurou reeleger-se, chamuscado que estava pelo Vietname, Carter queimadíssimo pelo Irão e a Economia, Clinton pelas conhecidas manchas na roupa, na Ética e na semântica. Obama pouco fez passar da sua agenda, mas, pelo menos, segurou avassaladoramente a popularidade entre as minorias que mais se reproduzem, pelo que isto é mais um combate para o triunfo a longo prazo, quando a configuração do Eleitorado for outra. Não tenho de meter o bedelho na forma como se rege uma casa que não é a minha, quer dizer, a Democracia. Mas parece-me inconsistente com as suas próprias assunções vedar acessos, por fixações arbitrárias de durações inultrapassáveis. Essa opção desmascara a triste essência de regimes que não se baseiam na Escolha, como apregoam, mas na contínua alternância, essa mudança puramente cosmética que perpetua o Poder de tracção dos pretensos progressistas. Daí que a finta de Putin/Medvedev na Rússia, para além de agradável pela humilde disponibilidade para servir em cago hierarquicamente inferior ao que se deteve, me encheu as medidas, ao frustrar as válvulas de segurança da instabilidade que, pelas movimentações menores, se eterniza.

Andar em Círculos

Imagino poucas penas infernais mais duras do que a de ter de suportar as imagens dos políticos. Figuras de estilo balofo, ou, simplesmente, papagueação de expressões feitas, essa  fast food do espírito que visa entreter o estômago da credulidade, mas é muito pobre de conteúdo e revela o decréscimo contínuo da Qualidade na classe politica. Veio o Primeiro Ministro acrescentar duas pérolas, a de garantir não estarmos a vogar num ciclo vicioso e a de desejar que vejamos todos a luz ao fundo do túnel. Não tem conta o número de gente com obrigações que arrota o primeiro disparate, quando a expressão original é círculo vicioso. Claro que esta última tem lógica, indica um processo em que, fazendo todo um caminho, se é reconduzido ao ponto de partida, assim como os impostos que se aumentam para fazer crescer a receita e que acabam por ver frustrada essa expectativa pela diminuição dos proventos sobre os quais incidiam. Talvez o Dr. Passos, intimamente, para escamotear a evidência, tenha negado o tal «ciclo» na ideia de abster da imputação de vícios o pessoal que emprega na sua fase governativa, não vejo outro sentido útil...
Já o Túnel do Marau - que não outro por demais encalacrado, o do Marão - é uma escavação tão sombria que não se percebe qualquer saída, salvo a com que o Cavalheiro nos brindou. Mas, de tanto procurar a tal luz, de repente, ao ler o modo como principiei este desabafo, senti-me macabramente iluminado: a sobredita luminosidade é a do fogo do Báratro, de que, cada vez mais, vamos sentindo os calores mesmo nesta galeria sinistra e arrastada que lá conduz, direitinho. Junto prova documental: Os Nove Círculos do Inferno, de Botticelli

Missão - quase - cumprida


Os abrileiros ´74 não queriam, de modo algum, uma Angola portuguesa... mas acham perfeitamente normal, e até aconselhável, um Portugal angolano.  

Fiel Aos Reis

A contra-ciclo me manifesto pela instituição de um feriado, quando a cegueira da produtividade insiste em arrasar uma série deles. O Dia de Reis, ainda tão importante em Países próximos, como Espanha ou Brasil, ao ponto de, entre Nuestros Hermanos continuar a ser o momento de eleição para a entrega dos presentes, que, dizem, em Portugal também já teve equivalente expressão nas ofertas da Velha Bifana aos meninos que se portassem bem. Talvez pela percepção suave de que, chegados a adultos, nos temos portado mais que mal, perde-se essoutra entrega dos presentes, mas no sentido de empenhamento dos que se encontram, outrora vazando para o afã dos Reisados que, também politicamente, todos teríamos a obrigação de ser. Mas quero deixar uma lamentação especial: o meio apertadinho das normas de segurança alimentar supra-nacional obrigou à supressão das prendinhas do Bolo-Rei. Olho para as três figuritas de Baltasar, Melchior e um envergonhado Gaspar por nome desditosamente partilhado, que guardei desde o derradeiro ano em que o brinde foi possível, retiradas de outros tantos exemplares da 8ª Maravilha do Mundo, ou seja, o referido doce natalício da Pastelaria Garrett, do Estoril. E, quer por pensar nesse tempo em que ainda tinha vivos os meus Pais, quer por relembrá-lo como capaz da mencionada pequena dose de tradição e tributo, choro o desvanecimento da Referência dos Magos. Daqueles que, em sonho, conseguiam ter a percepção de inimigos dissimulados e agiam em consequência, enquanto que nós, supostamente em vigília, nos tornámos abúlicos diante dos adversários evidentes. Pelo que concluo uma vez mais que, ao invés das prendas, a fava não foi retirada, antes nos saiu em desmesurado tamanho, consubstanciada na época que nos aprisiona.
                                  Santuário dos Santos Reis Magos, na Catedral de Colónia

Não Dão Ponto Sem Nó(s)

Bem me queria parecer que o elogio das instituições da União Europeia ao que sai das nossas torneiras, trazia água no bico, passe a redundância. Acarretando abstenções da  proveniência do panegírico, comportava,  uma ameaça, que dá azo, com a correspondente  azia, ao adeus a esta imagem reconfortante:

Bola de Crystal

Hugh Hefner tem todos os direitos e mais alguns de casar com a Crystal Harris, apesar dos sessenta anos de diferença e, cândido como me julgo, até aceitaria que amor ou admiração extremos augurassem um futuro se não grande, ao menos feliz ao enlace. Mas as declarações do último arrufo entre ambos, com ela a lamentar o fogacho que ele se revelava na horizontal e ele a garantir que a contraparte estava sempre interessada apenas na combinação do cofre, faz-me lembrar a avisada máxima do Papa Pio II:
«Amantes velhos acharás alguns, amado, nenhum».
Vale que em matéria de Coelhos, a terra de lá é mais de promissão do que a que nos calhou.

Nem Tudo o Que Luz...

Nas principais religiões do Mundo a Regra de Ouro consistia em não fazer aos outros o que se não desejasse para si. Mas o ateísmo da Contusão Europeia que pretente passar por "Construção" tinha de inverter o sentido profundo do normativo moral e fazer dela um orçamental limite cego de montantes percentuais deficitários. Entenda-se, viver dentro das respectivas possibilidades é um bem, e orçamentos equilibrados estão em linha com esse desiderato. Mas uma restrição desse tipo deveria apontar os domínios do desperdício em que os necessários e decorrentes cortes incidam, ou poderes sem escrúpulos como os que cá têm imperado farão sempre pagar a factura aos mais desprotegidos, em sintonia com os encerramentos de escolas e serviços de saúde das últimas décadas, como, igualmente, nos efectivos cortes de pensões. O problema maior está em tirarem o que disseram dar para sempre, ao apregoarem a rotunda treta dos direitos adquiridos. De modo que o Regime vigente não pode decentemente aspirar à duração que ambicionava, já que aqueles de que se arroga vêem implodir as contrapartidas que eram o seu único vago alicerce. A Regra de Ouro, nesta Sociedade de Futebóis em que nos tentam fazer ir prefigura-se mais como o Golo de Ouro que acarreta o fim do jogo.
                                                 Orçamento, de Alexandra Pacula

O Segredo da Engorda

Outra descoberta cujas gordas me deixaram siderado! Mas, lendo com atenção, reparo que, finalmente, a longevidade comparativa instilada pela gordura, não passava de uma incerta propensão à demanda dos médicos e ao funcionamento como uma espécie de amortecedor. Intrigou-me ser novidade uma tal insignificância: Dando tratos ao miolo, acabei por achar: visa tornar aceitáveis as tais «gorduras do Estado» e esconder dos porcos que também nos acham o sentido da crescente adiposidade que anuncia a matança a que destinam Portugal.
                                              A Cozinha de Polichinelo, de Tiepolo

Charutada

Há muito que era conhecida a popularidade da ficção de Dumas entre os operários das fábricas de Havanos e a sua consagração nos apreciadíssimos «Montecristos». Mas este excelente artigo traz-nos uma visão um tanto Kapciosa da relação do institucionalizado Leitor nos estabelecimentos fabris com as causas do fermento revolucionário. O Sr. Antoni Kapcia quer fazer-nos crer que o conhecimento de uns quantos Autores de tomo terá aumentado a consciência social indutora da Revolução, logo apresentada como uma coisa eminentemente estimável. Quando, porém, vemos a lista dos Escritores assim propagados, damos com baluartes do anti-igualitarismo, como o Conservadoríssimo Flaubert, o tonitruante Nietzshe, ou os Reaccionários Dostoievski e Balzac, apesar da deformação que Sartre & companhia fizeram dos dois Franceses. O problema foi outro e a explicação surge-nos na Florida, onde, havia muito, comunidades Cubanas imigradas também se dedicavam à confecção de charutos, tendo transplantado para lá o hábito de o fazer ao som da leitura a cargo de um contratado. É que, indo além da chinela que lhe competia, este último se revelava, amiúde, um agitador e, fora da sua incumbência de transmitir as obras primas, excitava os ânimos proletários contra o sistema do País de acolhimento, a pontos de vir a ser interditado, após célebre greve de 1931. Ou seja, não era o lido que funcionava como aguilhão, mas as opiniões e incitamentos emitidos para além dele, sugando-lhe o prestígio que a sua transmissão conferira. E o certo é que por muitos planos quinquenais e suas defesas que passassem a ser lidos na Cuba pré-Castrista, nenhuma dessas duvidosas sagas conseguiu dar-se como nomenclatura de marca com saída comparável à das aventuras literárias que preenchiam o imaginário dos ouvintes. De resto, por simpática que seja a ideia da elevação do conhecimento do Operariado, não embandeiro em arco com a "papinha feita" desta música de fundo, a qual, apresentando-se como meio de suprir as lacunas do analfabetismo, tem o inconveniente de esterilizar a aprendizagem que permita o emancipado acto de ler e a curiosidade devoradora que o torne cada vez mais proveitoso. Mesmo neste irónico ramo de actividade em que nem a predilecção de Fidel diminui a carga emblemática do produto final como o símbolo caricatural do Capitalista mais repulsivo.
                                                        A Fábrica de Charutos, de Ferdi Pacheco

(Dois Mil e) Treze à Mesa

A um País de pantanas pouco convirá mais que a autoridade do catálogo Pantone ditando a cor do ano. E a lição que nos dá é de ter acabado a relação com o Laranja de 2012. Tomara, mas não se percebe a escolha do Verde-Esmeralda como substituto. Tirando a hipótese de assegurar ao Sporting a escapadela à descida de divisão, no plano nacional ninguém confiará ao Partido Ecologista Os Verdes a gestão da pilha de resíduos em que se transformou o País. Isto para mostrar como são perniciosas as cores. Os partidos partiram-nos a resistência, com a presente doença e do seu pretenso remédio, qual deles o maior veneno. Um Presidente levado ao cargo por partidos vê a catástrofe, mas nada faz, com medo do drástico e dos ralhetes dos endinheirados de extra-muros. Sobra a apreciação de um simulacro de tribunal, com Conselheiros indicados pelas colorações diversas do Paralamento que presumivelmente votarão conforme essas tonalidades mandarem.

Em Itália havia um Homem. Fez obra, mas não conseguiu resistir aos apelos cromáticos e, em vez de andar a Monti dos partidos, vai estragar tudo e estragar-se a si, liderando uma paleta de combinação de vários agrupamentos. Cá, a Esquerda Bloqueada optou por uma hidra bicéfala menos assustadora da Burguesia e irritadora do Povo, na dupla Semedo/Martins, em jogada de banco para substituir a raiva estruturada e excitação suspeita do Dr. Louçã por postura relativamente cordata e fresca. Mas sempre, sempre os partidos, a pregarem-nos a partida, o que mostra o erro de diagnóstico do Conselheiro Jacinto Cândido quando alvitrava ser o «Personalismo», no sentido peculiar de adesões a figuras destacadas, o maior dos males. Está comprovado que muito pior é a cumplicidade de grupelhos, roubem e estraguem secretamente ou às claras. Pelo que urge pô-los de partida.

Contra o Império do Cartão!

Nesta vertente
ou naquela outra
uma realidade que a Utopia que honra manda descartar. Sobre a necessidade de não nos deixarmos submergir pelo conformismo, escrevi:

OS PÍNCAROS DO UTOPISTA

Por embarcar a fundo no Irreal,
vai granjeando chã censura
que não honra os seus autores,
no vigente medíocre atolados.
A mania de sarar, por outros fados,
libertando de tão tristes senhores,
vem de aspirar ao que o reles fura
com abolição infrene do Actual.

É esse o seu erro e a sua glória:
crer na sã emenda dos vindouros
a partir dum intrincado modelo
em sofridas reflexões mastigado.
A Espécie, reincide, por outro lado,
tornando estéril o solitário desvelo,
dirige as forças a palpáveis ouros,
só no ganho de um vendo a vitória.

Mas tem o sonhador aura garantida
ao assumir o fardo da liderança.
O Exemplo fica ligado à Figura,
no tributo como pela hipocrisia.
A insistência algo louca na sua via
induz imagem de natureza pura
e arrasta pela avidez qualquer Pança.
D. Quixote cresceu, nessa medida.

Uma Carga de Trabalhos

É o que ainda nos espera, segundo se depreende das declarações do Comissário Oli Rehn. Mas, com o Desemprego nos cumes em que paira, se entendermos a expressão sem nela imaginarmos figuras de estilo, até podemos entrever na predição um sinal de Esperança. A marcar este primeiro de mais 365, a assunção da presidência da coisa pela Pátria dos Duendes. Já que os políticos e financeiros racionais levaram a tranquilidade relativa em que se sobrevivia a dar com os burros na água, pode ser que do sobrenatural chegue o tal pote de ouro salvador. Desde que surja a Luz - porque o H2O, evidentemente, não nos tem faltado -, ainda um arco-íris poderá indicar-nos o caminho, mesmo que se circunscreva ao tal exemplo a seguir. Não sou tão optimista como isso, mas o certo é que sempre detestei os eternos iconoclastas da Hipocrisia que atiram as recorrentes pedradas ao Espírito da Época para se reconduzirem à inalterabilidade do horror que são o resto do tempo... Bom Ano!