Passos Perdidos

Tenho de fazer, aqui, uma retractação. Não obstante uma malograda candidatura de juventude ao MNE, um pouco influenciada por cordatas pressões familiares, jamais tive a Diplomacia por um rumo de vida invejável, ou desejável. Uma notícia de hoje impele-me a mudar radicalmente de opinião: a Carreira passa a oferecer uma imunidade muito mais apetecível do que a da subtracção às disciplinas de outros países. Precisamente a de escapar à imperatividade da celebração da ignomínia, ou seja, fintar a data despoletadora da liquidação do País e da grandeza da sua honrosa e resistente solidão. A fúria teórica contra a quantidade dos feriados ocupou consideráveis penas do Demo-Liberalismo enfeudadas à ideia fixa da Produtividade, tão diversas no tempo e nas proveniências ideológicas como a de Manuel Emygdio da Silva e Pacheco Pereira. Mas não se dignaram opinar sobre o âmago do problema, que é o da falta de qualidade de alguns desses pesadíssimos dias  leves. Naquele cuja celebração e, de facto, observância se passa a deixar na disponibilidade dos representantes de Portugal no Exterior verifica-se o cuidado de permitir finalmente uma personificação da dignidade intemporal da Pátria, libertando-a da ligação ao culto do localizado opróbrio da sua simbólica desintegração. Pena que se possa desconfiar de não mais ser do que consequência do desejo de limpar-se de supressões absurdas a ânsia de põr no mesmo saco bons e maus feriados, deixando de elencar na solenidade obrigatória as principais referências da Acção Patriótica e da Redenção Civilizacional, o 1º de Dezembro e a Sexta-Feira de Paixão.
                                                    Diplomata, de Shvelidze Murtaz

4 comentários:

  1. Nalguns casos, a única qualidade desses "pesadíssimos dias leves" é mesmo...permitirem um dia de folga!

    Ab
    Tiago

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  2. Sem dúvida, Meu Caro Tiago, mas a que, para lá do sempre apetecido lazer, mais conviria a fundamentação do luto do que a de comemorações.

    Abraço

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  3. Neste vergonhoso crepúsculo nacional, conclusão lógica de 38 abrilinos anos, para quê o Portugal nominal necessita de diplomatas? Para marcar presença em cocktails, jantares e vernissages? Ora se este "sítio" já é - há muito - governado por mão estrangeira! Fosse eu diplomata ou responsável consular pelo menos teria o gosto de não ser obrigado a celebrar a pérfida efeméride. Abraço!

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  4. Sim, Caríssimo Marcos, é uma libertação da Classe. Doravante, os que mais classe tenham rejubilarão por a representação dos restos mortais da Nação poder ser empreendida numa acepção liberta da ligação fatal ao Regime.

    Abraço

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