Na Época da Abundância por excelência, ainda que mitigada pelo actual conceito de crise, conviria à profundidade reflexiva que já desfrutou da fama de exame de consciência uma meditação sobre o destino dos nossos restos e desperdícios. Desde logo, o fenómeno crescente e horripilante de trapeiros tardo-vindos. Vejo a remexer nos caixotes cada vez mais pessoas que aparentam não ter feito carreira nesse sector de actividade. E pensar que a nossa má consciência, à qual, infelizmente, não escapo, não se traduz apenas em prezar um bom bife, pese a apregoada amizade pelos animais, mas, outrossim, na ligeireza com que encaramos este fenómeno! João Paulo II já escrevia que o homem de hoje, na sua solidão, transpira indiferença. Uma abordagem mais surreal levar-nos-ia a pensar se a suspensão da recolha do lixo a 24 e 25 de Dezembro, sendo incomparável com as acumulações napolitanas originadas doutras mafias, não mostrará um certo conformismo das autoridades face à extrema forma de indigência citada. Mas uma perscrutação eficaz poderá inclinar-nos mais para a hipótese de a voracidade do Poder por qualquer dinheirinho extra ter ficado impressionada com certo sucesso de onde nasce o Sol que deveria ser para todos e pretender mais tempo para, por cá, procurar sorte igual... Sério, sério, a maior superficialidade de todas é pacificamente repetir que as dificuldades nos levaram a produzir menos lixo, ignorando deliberadamente a parcela humana dele e o seu pior, que é o sistema que erguemos. Desvalorizar o egoísmo por detrás do sofisma e pactuar com a miserável elite dirigente ao volante da coisa é um luxo a que não nos podemos continuar a dar.
Camião do Lixo, de Joanna Mialkowska
Qualificar de "elite" o miserável lixo de dirigente que nos desgoverna, é uma cortesia do meu Querido Amigo...:))
ResponderEliminarBeijinho Paulo
Somente pela detenção de facto do Poder, não por serem um escol segundo critérios éticos, estéticos ou funcionais, Querida Ariel.
ResponderEliminarBeijinho
Meu Caro Paulo,
ResponderEliminarPor cá ninguém hoje esconde o papel fiduciário em armários ou colchões, seja por falta dele ou de vergonha na cara!
A verdade é que a troco de uma pequena taxa, símbolo da Mencionada voracidade do Poder, é o Próprio a encorajar ao seu branqueamento, podendo assim também o prevaricador ir obtendo uns lucros enquanto tem o tutu de quarentena.
Sou de opinião que mesmo que os Almeidas lisboetas decidam prolongar a suspensão da recolha do lixo até à entrada do Novo Ano, pela sua fraca produção "derivado da crise" (como sói hoje dizer-se) as acumulações ainda assim não se compararão às napolitanas bem como, pelo que expus anteriormente, também na qualidade não haverá comparação com os lixos nipónicos.
Um abraço
Meu Caro Pedro,
ResponderEliminartem o Prezadíssimo Amigo mais sorte que o Gastão, eu costumo ouvir é «derivado à crise». Mas claro que em tocando a tal lixarada, essas transferências poderão ser justificáveis como operação de reciclagem pela qual se cobra a grata remuneração da Sociedade, não pensemos o pior dos magnatas inquiridos!
Ainda bem que me assegura não valer a pena revolver os restos deitados ao caixote. Estava a ver-me passar um Natal ao relento nessa incessante busca de um Euromilhões menos refractário...
Abração