Sem Rei Nem Grei!

Confirma Sousa Bastos que a Procissão do Corpo de Deus, saída da Sé na data da comemoração era a mais afamada de Lisboa, onde se incorporavam os próprios Soberanos de Portugal, o que se atesta nesta fotografia do provisoriamente Derradeiro Deles. Sintoma da nossa decadência é a preparação minuciosa de festejos estar hoje reservada a a alarvidades como o Carnaval, ou a festejos dignos mas com cada vez mais reduzida reflexão te(le)ológica, como os dos Santos Populares. Esta que hoje teria lugar começava um mês antes, com as principais artérias da Capital ostentando as janelas e varandas com colchas e demais panos preciosos dependurados, à maneira do que ainda se faz em Espanha nos momentos festivos e hábito que de cá desapareceu, talvez por não restar muito para celebração. A relevância pública ia a pormenores como a mudança de fardamento dos militares, que iniciavam o uso da calça branca estival nesse dia. Era o evento mais interclassista, com popularíssima afluência, incorporação das elites do Reino, Família Real e Pares à cabeça; e todo o Cabido e Irmandades, marcando a presença das Basílicas e Referências de Culto. Como também transversal em matéria de etnias, fazendo desfilar desde oito dias antes o Estado de São Jorge, composto pela Comunidade Negra tornada Alfacinha. Tudo sob a invocação do Santo nomeado, a da vitória em Aljubarrota, cujo intérprete vinha do Castelo para baixo, após ser içado por guindastes similares aos que faziam montar os cavaleiros e armaduras respectivas no célebre filme de Orson Welles.
Tempos em que o sentimento comunitário era mais do que o pretexto para as risadas escarninhas, de hoje, salvo quando são substituídas pelos apelos a "exercício de cidadania", gritos de impotência e esgares manipulatórios que semeiam cada vez maior aversão.

6 comentários:

  1. Belíssima Evocação, Caríssimo Amigo!
    Abraço.

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  2. Muito obrigado, Meu Caro João. E a pintura do Amadeo, do link, cai no goto dos mais Sensíveis, está visto.

    Abraço forte

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  3. Excelente. E a fotografia, uma preciosidade.

    Beijinhos.

    Este mundo, infelizmente, acabou.

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  4. Obrigado, Querida Zazie. Tirei-a do calhamaço do Rocha Martins sobre D. Manuel II e, dado o peso da coisa, fiquei a matutar sobre se tamanho esforço em Dia Santo não seria pecado.

    Jokinha

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  5. Fiquei encantada com a foto a cores que não conhecia porque geralmente são todas a preto e branco. Gostei também muito do seu texto e tomei a liberdade de o copiar para o blog Família Real Portuguesa. Conto com a sua visita.
    Bem haja!

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  6. Muito obrigado, Maria. Já Lá fui e senti-me muitíssimo honrado por ter achado este postalinho digno de integrar tão Excelso Blogue.
    Permito-me, em nome de todos os «jovens» formular o voto de A ver muito mais vezes por cá.

    Beijinho

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