Os pequenos partidos

Nunca percebi muito bem o desprezo com que as emissões especiais das eleições tratam os pequenos partidos, ou seja aqueles que não têm representação parlamentar. Nas Legislativas de domingo o desprezo foi mais uma vez evidente, e nenhum dos canais se dignou a comentar ou sequer mostrar os resultados desses partidos. Quem não conhecer a paisagem política portuguesa corre o risco de pensar que se trata de uma corrida a cinco. O que não corresponde minimamente à verdade.

PCTP/MRPP: O i apelidou Garcia Pereira o rei do Portugal dos Pequeninos, visto que o MRPP é o mais votado dos partidos sem representação parlamentar. Em 2009, ultrapassou a barreira dos 50.000 votos (52.632 para ser mais exacto), o que garantiu subvenção estatal para cobrir as despesas da campnha. Dois anos depois, o partido consolidou o seu resultado e cresceu, conquistando 62.496 votos. As hipóteses de eleger um deputado continuam remotas, até porque nos principais centros urbanos o PCTP/MRPP não conseguiu ser o pequeno partido mais votado (Lisboa, Setúbal, Faro, Coimbra, por exemplo). O que nos leva ao...

PAN: A surpresa da noite. Criado no início de 2011, era a primeira vez que o Partido dos Animais e da Natureza se candidatava a umas eleições. E que estreia! Com 57.641 votos, calou muitos que não previam mais do que uma dezena de milhar de votos e garantiu a ambicionada subvenção estatal. Com um programa vago em torno da defesa dos animais e do fim das touradas, o PAN contou com o apoio de várias figuras públicas que deram a cara pelo partido. E embora tenha ficado aquém da eleição de Paulo Borges, o PAN conseguiu ser o pequeno partido mais votado em alguns grandes centros urbanos, onde pode ter sido um dos responsáveis pelo esvaziamento do Bloco de Esquerda.

MPT: Após a coligação desastrosa com o Partido Humanista nas Legislativas 2009 (rendeu 12.025 votos), o MPT obteve nestas eleições um resultado semelhante ao das Europeias 2009 (23.415 votos), com 22.498 votos. Se pode ser considerado um bom resultado tendo em conta a modesta campanha do partido, é certamente uma má notícia para Pedro Quatin Graça, cujo objectivo eram os 50.000 votos para cobrir as despesas de campanha.

MEP: Um dos derrotados da noite. Se não bastasse a experiência MMS, está provado que não basta atirar dinheiro à campanha, com cobertura da imprensa, outdoors e autocarros de voluntários, para eleger deputados. Com 21.751 votos (em 2009 teve 25.335), o projecto pessoal de Rui Marques falhou em toda a linha e não conseguiu sequer chegar a metade dos votos necessários para garantir subvenção estatal. O presidente já pediu a demissão e agora resta saber o que vai acontecer a este partido cujos objectivos nunca ninguém percebeu muito bem.

PNR: Silenciosamente, o partido nacionalista vai alargando os seus horizontes. De 2009 para cá, o PNR cresceu dos 11.614 para os 17.621 votos e é um dos únicos partidos portugueses que nunca viu decrescer a sua votação. Passada a fase mediática, o partido de José Pinto-Coelho tem conseguido promover um crescimento sólido e sustentado por todo o país, ultrapassando partidos com mais historial e projecção mediática, como o PPM e o PTP. É sabido que o grande objectivo dos nacionais-renovadores é a eleição de um deputado, mas este resultado só pode ser considerado animador.

PTP: O número do palhaço só funcionou uma vez. Após a surpresa das Presidenciais, em que obteve quase 200.000 votos, José Manuel Coelho não foi além dos 16.724. O que, mesmo assim, representa uma subida substancial face ao resultado do PTP em 2009 (4.789 votos). Nem sequer na Madeira o Tiririca português salvou a votação do PTP, não indo além da sétima força política (em treze).

PPM: A cara bonita de Aline Gallasch-Hall espalhada por Lisboa não bastou para convencer os eleitores. O PPM manteve praticamente a votação de 2009 (14.999 votos), com 14.982 votos. O que significa que o partido monárquico atingiu o seu tecto eleitoral. Um resultado triste para um partido histórico português, que chegou a pertencer a uma coligação governamental. Está na altura de mudar de vida.

PND: Mais uma força política agonizante. Fracassado o projecto de Manuel Monteiro de um partido conservador-liberal-populista, o PND está reduzido a uma frente de inimigos de Alberto João Jardim. Depois de um dos piores tempos de antena que Portugal já viu (é essa a Nova Democracia?), perdeu quase metade da votação de 2009, não indo além dos 11.671 votos, um terço dos quais na Madeira.

PPV: É questionável o sentido de um partido que faz do seu motivo de existência a revogação da lei do Aborto. Mesmo assim, o PPV manteve praticamente a votação de 2009 (8.485 votos), com 8.210 votos.

POUS: É célebre a tenacidade do partido de Carmelinda Pereira. E a insistência dá frutos, pelo menos em certa medida. Nestas eleições, o POUS cresceu 400 votos, passando dos 4.320 para os 4.601 votos. Além disso, deixou de ser o último dos pequenos partidos.

PDA: Para estas eleições, o PDA apostou numa aliança regionalista com os subscritores do Partido do Norte. No entanto, o resultado não foi famoso e rendeu apenas 4.531 votos. Prova de que Portugal é pequeno demais para regionalismos?

PH: Por último, o Partido Humanista, que parece estar em queda livre. Se nas Europeias 2009 obteve 16980 votos, a coligação com o MPT rendeu 12025 votos nas Legislativas seguintes. Apesar disso, nestas eleições o PH não foi além dos 3.528 votos, o que é um resultado francamente mau, até para um pequeno partido.

9 comentários:

  1. O PDA onde lhe interessa (Açores) ficou logo atrás do MRPP e do PAN, infelizmente é obrigado a concorrer ao país todo para ter direito a tempo de antena na tv e na rádio!

    E a ver vamos que combate travamos nas Autárquicas e nas Europeias em Lisboa :)

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  2. Atenção também ao desprezo, genético talvez, da imprensa escrita para com os pequenos partidos, nem os jornais onde escrevo se mostraram, para minha frustração, imunes.

    É algo que surge de modo tão natural nas conversas com os jornalistas (e com o povo) que é impossível haver quem discorde que os portugueses têm um mínimo de cultura democrática europeia.

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  3. Caro Flávio,
    Nos Açores, o PDA não foi além de 371 votos, num universo de 90.000 eleitores. Por muitas voltas que se dêem, é um mau resultado.
    Quanto ao desprezo dos pequenos partidos, eu percebo que os jornais tenham de dar mais relevância aos «cinco» maiores. O que não percebo é que os pequenos sejam simplesmente varridos das notícias. Enquanto alguns jornais dedicaram no dia seguinte uma coluna aos resultados dos partidos sem representação, durante as emissões especiais as televisões nem sequer mostraram os resultados.
    Abraço.

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  4. É uma ditadura cada vez menos disfarçada, a meu ver está legitimada a via da luta armada pelo que testemunhei nestas eleições.

    371 votos de Übermensh num universo de dezenas de milhar de Untermensh parece-me muito bem :)

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  5. Quando já não nos podemos agarrar a nada mais, agarramo-nos ao delirio, força nisso Flávio.

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  6. Excelente análise, Caro Miguel. Definitivamente esses pequenos partidos e as suas "histórias" são bem mais interessantes do que a sensaboria da banda dos "5", sobretudo do inenarrável e inevitável bloco central. Um forte abraço!

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  7. Bom, pelo menos a direcção do PDA não quer levar a tribunal uma mão cheia de conselheiros nacionais e cabeças de lista candidatos nestas eleições, logo o delírio ainda não é tão grave como noutros :)

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  8. Caro Flávio,
    Se achas realmente que está «legitimada a via da luta armada», fica a saber que esse ponto de vista não é subscrito por nenhum dos elementos deste blogue. Abraço.

    Caro Marcos,
    Obrigado pelo comentário. De facto, a história do tal «bando dos cinco» é dissecada até à exaustão. Abraço!

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  9. Claro que não, são de Direita :) até os comentários em blogues já são motivo de receio. Portugal não chegou a este ponto por milagre, foram necessárias umas décadas de cobardia pelo meio. Eu incluso.

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