Divertimentos de Rua

Quem canta seu mal espanta poderá ser muito verdadeiro, mas para o seu sofrimento pessoal e intransmissível. Quando é colectiva a indisposição, torna-se redundante e repulsivo o protesto que opte por dançar e cantar. Não só porque a gravidade dos golpes acarreta a desconfiança perante formas tão alegres de contestação, como por, mesmo metaforicamente, estar inculcada no Grupo a noção de que, cada vez mais, a vida é uma dança e de que propostas pouco articuladas de a remediar são mais uma forma de nos dar música. Quando a infelicidade decorrente das más governações aperta, a necessidade de reagir não se compadece com estratégias circenses de passeios públicos, a irreverência festiva só acha terreno favorável em tempos de comparativa fartura. As Pessoas que sentem na carne os efeitos das aleivosias estatais já não têm disposição para alinhar com pantominas. Daí que os organizadores desta jornada de luta não se possam queixar da fraca adesão, nem sequer com ela surpreender-se: a RUA está reservada como destino a dar aos políticos incapazes, não como local de ocupação das vítimas deles.
                                         O Saltimbanco e o Xadrez, de Paul Vanier Beaulieu

4 comentários:

  1. Fosse eu jornalista do Público e esta notícia sairia na seccção "LOCAL" com o seguinte texto:

    SANTOS DE CASA NÃO FAZEM MILAGRES

    Depois do retumbante êxito na Capital, em 15 de Setembro, onde à frente de um coro improvisado foi ovacionada de pé por uma assistência que se calculou em cerca de meio milhão de pessoas, e da magnífica actuação a solo, em 5 de Outubro, para Sua Excelência o Presidente da República na televisionada cerimónia de aniversário da dita cuja, nada fazia prever que a estreia como maestrina do "Coro de Intervenção do Porto", da soprano Ana Maria Pinto, em frente aos Passos do Concelho da cidade que a viu nascer, pudesse redundar em tamanho fiasco!
    Como se lhe não bastasse um Edil que, mais dado a portos sentidos que a vilas morenas, para lá de não mandar engalanar janelas e varandas tampouco se dignou dar ares da sua Graça, e ainda teve que se conformar com um total de, entre coro e assistência (desdobrando-se nas funções), menos de metade dos 136 likes conseguidos até hoje na página do facebook.
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    É caso para se dizer, meu Caro Paulo, que esta Senhora é uma lírica!

    Abraço

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  2. Meu Caro Pedro,
    a vida é dura para os artistas que se tentam aproveitar da dureza da vida! Mas este movimento anonymous, com a confusa filiação nas máscaras de Guy Fawkes trazidas à colação pelo «V For Vengeance», cuja genealogia já aqui abordei, merece outro "V", não o da vitória, mas o da vigilância.

    Abraço

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  3. Fiquei surpreendida com esta manif, houve aqui qualquer coisa que não percebi, porque surgiu nas redes sociais a convocatoria para o dia 2 de Fevereiro mas logo a seguir, surgiu outra para Março. Há aqui alguém que anda literalmente aos papeis, Então aquela gente não se apercebeu que a coisa não tinha a minima mobilização? Estranho....

    Beijinho

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  4. Querida Ariel,
    pelo que me conta, a propensão festiva arrasta a moleza e o amadorismo. Podiam tomar explicações com qualquer dos concentrados na Praça Tahrir, esses ases da convocatória para onde realmente doía e que não pensavam em levar as gentes em cantigas. Destas, pelo menos.

    Beijinho

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