O Mal dos Delírios

É inevitável a procissão de desconfianças quanto à responsabilidade de uns rapazes obscuros importados da Tchetchénia, mortos ou quase, pelo atentado de Boston. A nossa inconsciência, tanto como o nosso Inconsciente, não suportam ver na prefiguração do Mal tão raquíticas formas. Quereríamos ou um grupo poderoso que desencadeasse uma ameaça permanente, ou uma boa conspiração que permitisse anatematizar com o fundamento imediato da repugnância os poderes instituídos, com o auxílio de um assassínio alarmantemente cego. Mas a confusão da Maldade com a Grandeza é um sintoma da loucura e, precisamente, uma escapatória de plausibilidade para a explicação que do triste facto nos dão. Os loucos julgando-se Napoleão foram erguidos a ícones da alienação. No caso vertente, um havia que até se chamava Tamerlão, o equivalente no Cáucaso à megalomania de Bonaparte. Pode, perfeitamente, ter vingado nos dois jovens a ânsia de promoção por um acto cuja notoriedade, ainda que maligna, os transportasse ao ilusório sobredimensionamento que decidir a morte de outros dará. Claro que o significado da palavra Tamerlão, Ferro Coxo, indica a falência do grandioso nessa fria dureza. Mas isso são contas dum rosário outro que o das ampliações que nós e eles propendemos a fazer do Mau. E é nessa linha que as declarações do Tio dos terroristas artesanais - mas mortíferos - ganha alguma importância: dizer que fizeram o que terão feito por serem uns perdedores invejosos do sucesso de outros, se reduz às devidas proporções o acto criminoso e despromove a legitimação por um ideal, ergue artificiosamente a uns píncaros imerecidos um sistema concorrencial odioso da sociedade de um Sonho exclusivamente Americano, em que os infelizes não têm lugar. O que, se não desculpa assassínios, pode perigosamente conduzir a simpatias tão injustas como desqualificadoras.
                                                     Vencedores e Perdedores, de Simon Shegelmann

4 comentários:

  1. Meu Caro Paulo,

    Então e uma boa conspiração que permita anatematizar com o fundamento imediato da repugnância uma mudança nos poderes instituídos?
    Teriamos nesse caso que a teoria do Tio dos terroristas artesanais, sem dúvida correcta, se aliaria na perfeição à dos Pai, Mãe e Tia que juram a pés juntos que os homicidas terão sido alvo duma cilada! Quando a luta por mudanças na lei das armas anda ao rubro no Congresso americano, demonstrar que com simples panelas de pressão, pregos, rolamentos e pouco mais, qualquer rapazola (ou rapazinho estudante) poderá provocar, assim lhe dê na veneta, danos ainda mais gravosos do que com armas convencionais, é capaz de pôr muitos Democratas a pensar uma segunda vez.

    Um abraço

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  2. Ó Meu Caríssimo Pedro, que espanta uns Pais não acreditarem ou não quererem aceitar (n)a malignidade dos rebentos? E a Tia, se menos próxima carnalmente, com o vício da profissão de advogada que exerce...
    Como já disse, a maioria americana fanatizada pelo direito histórico do porte de armas vai cair que nem rapina sobre estes arcaicos mas mortíferos engenhos terroristas, com o para eles luzidio argumento de que os infractores são sempre engenhosos e encontram com que matar, as pessoas honestas é que precisam de adquirir facilmente os meios de se defenderem. Mesmo que seja um míssil, acrescentamos nós jocosamente, mas eles não se riem.

    Abraço

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  3. É obvio que o tio dos rapazes, com o anátema da inveja, pretende sacudir rapidamente alguma água que possa ter ficado retida no seu capote . é que ser sinalizado como tio de terroristas deverá ser um fardo bem difícil de carregar lá pelas terras do Tio Sam.

    Beijinho Querido Paulo

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  4. Sem dúvida, Querida Ariel, o estatuto de perdedor é contagioso e uma família assim péssima publicidade para quem se move naquele mercado, digo País.

    Beijinho

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