Por Baixo da Mesa?

A Corrupção está onde o homem estiver? Bem, pelo menos onde estejam homens com desejos - que são todos - e sem resistências morais, que vão sendo, como sempre, demasiados. Em Portugal desde tempos imemoriais, que se considera natural nas camadas inferiores da burocracia estatal ou autárquica passar umas notas para dar um jeitinho, porém, tal tolerância não se estende aos cumes da Política, talvez por se perceber como antipáticas as transferências para contas escondidas que apenas aos recebedores dêem um jeitão. Apesar de casos conhecidos por provar, na I República, na que agora nos esmaga foi preciso esperar pela entrada em força de uma classe política arrivista para se suspeitar por sistema de figuras cimeiras da administração, nisto em tudo diferentes da da maioria dos seus fundadores, reconheça-se. Walpole, o antigo Primeiro-Ministro Britânico passou à História como autor da frase «todos os homens têm um preço», quando o que dissera fora apenas «todos estes homens têm um preço», referindo-se aos membros do seu Gabinete. Quer dizer, uma frase desculpadora passou a ocupar o lugar de uma incriminatória e, se formos rigorosos, de sinal contrário. A lembrança desta confusão assaltou-me, ao ver, na Imprensa de hoje, noticiado o mesmo facto, a classificação de Portugal entre os países corruptos. Uns dizem que é o «33º menos corrupto», outros que «se encontra entre os mais corruptos». Será a questão do cálice meio cheio ou meio vazio? Talvez, os primeiros reportam-se às paupérrimas expectativas da População crescentemente hostil aos poderosos e admiram-se de serem tão poucos, na senda da Dr.ª Cândida Almeida que, justificando o nome de baptismo, lhes negava a relevância. Os demais, apegados ao digno totalitarismo da Moral rasgam as vestes por verem a corrupção grassar mais do que deveria. Ou tudo se explicará pelo facto de os que a acharam diminuta terem encontrado o seu mais popular meio de expressão num jornal desportivo, ou seja, de um segmento da actividade humana em que a sombra dela espreita atrás de cada porta? É um tema que deixo sobre a mesa.
                                                Legislação Corrupta, de Eliju Vedder

7 comentários:

  1. Aprendo sempre com o meu Querido Amigo, desconhecia por completo a origem da frase original de Walpole, que veio a ser completamente desvirtuada ao sabor de conveniências apaziguadoras de consciências.

    Beijinho

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  2. O que me alarma é ver o número de casos reportados envolvendo agentes de instituições cuja função é precisamente lutar contra esse "cancro",como procuradores, juízes e polícias (incluindo membros da PJ)...

    Não sei se isso traduz um aumento real de casos com essa tipologia ou se é apenas um reflexo da sua maior divulgação, mas que não é muito tranquilizador, não é...

    Ab
    Tiago

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  3. Querida Ariel,
    não é um verdadeiro branqueamento do passado daqueles políticos e, por via da globalização da venalidade, do futuro de todos os restantes?

    Meu Caro Tiago,
    corruptos sempre haverá, mesmo onde menos seria de esperar; mas ingénuo como sou, até me disponho a acreditar que sejam muito minoritários. O pior de tudo, para mim, é a percepção atemorizante que grassa nas magistraturas de que sempre que esteja em questão peixe graúdo é melhor não acusar/condenar, ou ainda se sai chamuscado.

    Beijinho e abraço

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  4. É. Tudo isso (incluiundo o patético caso do "copianço" dos aspirantes à magistratura) contribui fortemente para o descrédito actual da Justiça que, segundo muito boa gente, é a raiz de boa parte dos nossos actuais problemas...

    Ab
    Tiago

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  5. Ah, esse célebre shotcut para as cadeiras de julgamento...
    Mas já se sabe que o Escrúpulo é uma "caretice", coisa de cotas como nós.

    Abraço

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  6. "O 33º menos corrupto": nunca um número foi tão significativo, tanto na sua simbologia como na forma como a ele estão associadas redes criminosas que sugam (material e moralmente) a Nação em proveito próprio.

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  7. Ehehehehe, sempre Oportuno, Caríssimo Átrida!
    Também se poderia dizer que trinta e três é o que nos manda dizer o otorrino que trate o País nesta matéria criminal, em que deixou de ter a garganta de outrora...

    Abraço

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