Este País Não é Para Velhos

Uma traumatizante razão biográfica faz com que em mim constate, passados 22 anos, alguma antipatia persistente para com a Dr.ª Manuela Ferreira Leite. O que não me impede de com ela estar em total e absoluta concordância quando denuncia como logro intolerável a infame diminuição das retribuições dos Pensionistas que descontaram uma vida inteira na esperança cada vez mais infirmada de escaparem à miséria. A insensibilidade imbecil destes governantes escolhidos pelo Povo traz-me à lembrança uma história que já contei na blogosfera, a do ancião da Grécia Antiga que procurava inutilmente lugar nas bancadas do recinto onde os jogos se disputavam, até que chegou à parte ocupada pela claque Espartana, onde todos os jovens e muitos dos de meia idade se levantaram para lhe dar o lugar, perante a ovação dos demais espectadores. Terá então exclamado o Beneficiário: «Todos os Helenos conhecem o Bem, mas só os Lacedemónios o praticam!». Da mesma forma, os ocupantes do Poder em funções, sempre cheios de boas palavras para com a dignificação da Terceira Idade, mas sonegando os meios que permitam concretizá-la, ao menos um poucochinho. Temo que seja mais que incompetência aliada a voracidade fiscal: pressinto neles uma raiva inconsciente contra a maior longevidade, que faz mal às Finanças, com os cofres públicos a gastarem mais e deixando nas ruas da amargura a Segurança Social. Pode ser que um dia uma sucessão vingadora os prive das benesses de que espoliaram os outros. Mas isso não me alegra, pela abrangência fatal das tributações que não permite isolar os responsáveis. Resta a hipótese de ao terrível peso da secura dos muitos anos virem a juntar a tortura de algum remorso redentor capaz de os fazer entender que velhos são os trapos é adágio bem contrário à estulta (ainda que abafada) conclusão "os velhos são trapos". Para que ao menos tenham ideia da lastimável condição dos Gerontes, penosa mesmo para os que amealharem do poleiro para o Futuro, fica a genialidade comovedora de Jacques Brel, com «LES VIEUX»:
Les vieux ne parlent plus ou alors seulement parfois du bout des yeux Même riches ils sont pauvres, ils n´ont plus d´illusions et n´ont qu´un cœur pour deux Chez eux ça sent le thym, le propre, la lavande et le verbe d´antan Que l´on vive à Paris on vit tous en province quand on vit trop longtemps Est-ce d´avoir trop ri que leur voix se lézarde quand ils parlent d´hier Et d´avoir trop pleuré que des larmes encore leur perlent aux paupières? Et s´ils tremblent un peu est-ce de voir vieillir la pendule d´argent Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, qui dit : je vous attends? Les vieux ne rêvent plus, leurs livres s´ensommeillent, leurs pianos sont fermés Le petit chat est mort, le muscat du dimanche ne les fait plus chanter Les vieux ne bougent plus, leurs gestes ont trop de rides, leur monde est trop petit Du lit à la fenêtre, puis du lit au fauteuil et puis du lit au lit Et s´ils sortent encore bras dessus, bras dessous, tout habillés de raide C´est pour suivre au soleil l´enterrement d´un plus vieux, l´enterrement d´une plus laide Et le temps d´un sanglot, oublier toute une heure la pendule d´argent Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, et puis qui les attend Les vieux ne meurent pasils s´endorment un jour et dorment trop longtemps Ils se tiennent la main, ils ont peur de se perdre et se perdent pourtant Et l´autre reste là, le meilleur ou le pire, le doux ou le sévère Cela n´importe pas, celui des deux qui reste se retrouve en enfer Vous le verrez peut-être, vous la verrez parfois en pluie et en chagrin Traverser le présent en s´excusant déjà de n´être pas plus loin Et fuir devant vous une dernière fois la pendule d´argent Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, qui leur dit : je t´attends Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non et puis qui nous attend.

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